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Pouca coisa mudou no sistema penitenciário 20 anos após Massacre do Carandiru
Criado em 02/10/12 18h09
e atualizado em 02/10/12 18h49
Por Leandro Melito - EBC
Brasília - Há exatamente 20 anos, no dia 02 de outubro de 1992, 325 policiais - sem insígnias e crachás de identificação – invadiram o pavilhão 9 da Casa de Detenção de São Paulo, o extinto Carandiru - e executaram 111 detentos que haviam se rebelado após uma desavença interna entre os presos.
O governo, apesar de saber que o número de mortos excedia 100 pessoas, divulgou o número de mortos na chacina só após o final das eleições municipais, quando as urnas estavam fechadas, já no final da tarde de domingo, dia 2.
Ouça reportagem da Rádio Agência Nacional:
Mudanças
Apesar da estrutura física do Carandiru ter sido implodida anos depois, dando lugar ao Parque da Juventude, organizações de direitos humanos apontam que o sistema carcerário ainda não solucionou os principais problemas que causaram o episódio, como a superlotação dos presídios e a impunidade dos autores do crime.
“A construção de um parque para a juventude no lugar de uma unidade de aprisionamento da juventude não significou qualquer mudança na política criminal do Estado”, aponta a rede 2 de outubro, formada em 2011 por um conjunto de organizações, movimentos sociais e movimentos culturais.
Essa é também a percepção da organização internacional de direitos humanos Conectas. "O Massacre do Carandiru não pertence ao passado. Muitas de suas causas continuam vigentes no sistema carcerário atual", afirmou a ONG em nota à imprensa.
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Superlotação
Para a diretora de programas da organização, Juana Kweitel, a superlotação e as más condições de detenção são alguns dos principais problemas que contribuíram para a tragédia “ O problema não é a falta de vagas em si, mas a política de encarceramento em massa”, afirmou.
No dia do massacre, o Carandiru abrigava 7.257 detentos, mais que o dobro da sua capacidade. Hoje, 20 anos após a chacina, o Brasil tem mais de 550 mil pessoas presas. “Neste intervalo, o mote da política penitenciária brasileira tem sido a construção de mais presídios, favorecendo a expansão no número de vagas em vez de políticas desencarceradoras reais”, aponta a ONG Justiça Global. Segundo a organização entre 1995 e 2010 a taxa de detenção passou de 95 para 260.
O Brasil já tem a quarta maior população carcerária do mundo, segundo a ONU. Apenas em São Paulo são 180.059 pessoas presas – o dobro em relação a 2001, enquanto a população do Estado cresceu apenas 12% no mesmo período.
Segundo Juana Kweitel, a superlotação, além de tensionar o sistema, cria condições desumanas de encarceramento que configuram tortura e maus tratos. “Não haverá construção de presídios que dê conta da atual taxa de encarceramento. Todos os dias entram no sistema mais pessoas do que saem. É necessária uma reforma profunda do sistema de justiça criminal que valorize penas alternativas às de prisão”.
Impunidade
Antes de completar uma década, o Massacre do Carandiru foi objeto de apreciação pela Comissão Interamericana de Dieitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos. Em 2000 um relatório produzido pela organização declarou o país responsável pelas mortes dos 111 internos do Pavilhão 9 e qualificou a operação como brutal e selvagem.
Na época, a Comissão recomendou ao Brasil “desenvolver políticas e estratégias destinadas a descongestionar a população das casas de detenção e prevenir surtos de violência nesses estabelecimentos”.
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Passados 20 anos, não há condenados pelo massacre do Carandiru
Dois anos depois, completados 10 anos do Massacre e, apesar de ter sido inicialmente condenado, o responsável pela coordenação da operação, o coronel Ubiratan Guimarães foi eleito deputado estadual em São Paulo, com o número 14.111, em clara alusão ao número de mortos no massacre.
Até hoje, nenhum dos envolvidos foi julgado em primeira instância. “ Além do evidente risco de prescrição dos crimes, o enorme lapso temporal entre os fatos e o futuro julgamento apenas fomenta a sensação de injustiça e impunidade”, afirma a Conectas.
Ouça reportagem da Rádio Agência Nacional:
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