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O pianista Francisco Tenório Cerqueira Jr. desapareceu na Argentina em 18 de março de 1976 , seis dias antes do golpe militar no país

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Comissão da Verdade vai investigar desaparecimento de Tenório Jr

Criado em 14/03/13 19h08 e atualizado em 17/03/15 15h50
Por Leandro Melito - Portal EBC

Elis Regina dedicou o disco Essa Mulher, lançado em 1979 pela Warner, à “ausência Francisco de Tenório Jr”. O pianista brasileiro Francisco Tenório Cerqueira Júnior desapareceu em 1976, em Buenos Aires, seis dias antes do golpe militar que derrubou a presidente Isabelita Perón, na Argentina. Seu sumiço mobilizou toda a classe artística na época e Elis foi uma das figuras que buscou, em vão, encontrar informações sobre Tenório. O desaparecimento do pianista será agora investigado pela Comissão Nacional da Verdade, a pedido da mulher e filhos do músico que procuraram a Comissão em fevereiro deste ano. Com 35 anos à época, Tenório não tinha envolvimento com movimentos políticos. Deixou no Brasil quatro filhos e a esposa Carmen Cerqueira, então grávida de oito meses.

Tenório Jr. desapareceu na Argentina em 1976
O pianista Francisco Tenório Cerqueira Jr. desapareceu na Argentina em 18 de março de 1976 , seis dias antes do golpe militar no país (Reprodução)

Elis Regina dedicou o disco Essa Mulher, lançado em 1979 pela Warner, à “ausência Francisco de Tenório Jr”. O pianista brasileiro Francisco Tenório Cerqueira Júnior desapareceu em 1976, em Buenos Aires, seis dias antes do golpe militar que derrubou a presidente Isabelita Perón, na Argentina. Seu sumiço mobilizou toda a classe artística na época e Elis foi uma das figuras que buscou, em vão, encontrar informações sobre Tenório.

O desaparecimento do pianista será agora investigado pela Comissão Nacional da Verdade, a pedido da mulher e filhos do músico que procuraram a Comissão em fevereiro deste ano. Com 35 anos à época, Tenório não tinha envolvimento com movimentos políticos. Deixou no Brasil quatro filhos e a esposa Carmen Cerqueira, então grávida de oito meses.

Na ocasião de seu desaparecimento, o pianista acompanhava os músicos Vinícius de Moraes e Toquinho em duas apresentações no teatro Gran Rex, em Buenos Aires. No dia 18 de março daquele ano, Tenório desceu de seu quarto no hotel Normandie na Avenida Corrientes e deixou um bilhete na porta de Vinícius. “Vou sair para comer um sanduíche e comprar um remédio. Volto logo”. Nunca voltou.

O músico Frederico Mendonça de Olivieira, é o autor o livro O Crime Contra Tenório. Na obra, ele conta que uma turma de marines comandada pelo tenente de navio Alfredo Astiz esperava um encontro entre dois líderes guerrilheiros na esquina da Corrientes com Rodrigues Peña, mas o encontro não aconteceu. Na eminência de um golpe de Estado, Tenório foi parar bem ali. “Não tendo ocorrido o “ponto”, Astiz ordenou que prendessem aquele tipo exótico”. Segundo a descrição do autor, o pianista estava com barba imensa, cabeleira farta, japona de couro, camisa quadriculada, calças, jeans e botas.

“Entreguei tudo que tenho sobre o caso, sobre o que me debrucei por quase uma década, à Comissão da Verdade. Tive contato com um de seus membros e enviei o dossiê com esperança no coração quanto ao que restou da família, especialmente pela real preocupação com a Carmem, viúva, que até hoje amarga uma vida pra lá de difícil, além do ônus da perda do marido e da posterior morte de dois dos filhos do casal”, afirma o autor.

A busca de Elis 

Em entrevista à Rádio Nacional do Rio de Janeiro no dia 07 de julho de 1979,  Elis fala sobre a passagem que teria agendado para ir à Argentina em meio a uma turnê internacional que incluiu o Festival de Montreax, na Suiça, além de Bélgica e Japão.“Vou à Argentina rapidinho, duas semanas, graças a Deus, fazia tempo que eu não ia lá, tô muito a fim”, diz ao apresentador do programa Guilherme Daniel.

Em outra entrevista, realizada no dia 03 de junho daquele mesmo ano pelo Folhetim, caderno do jornal Folha de S. Paulo, Elis contou mais sobre sua visita ao país vizinho. “Vou fazer um giro pela Argentina que tem não só, pra mim, a finalidade de ir até a Argentina para fazer um negócio que estão me pedindo já há algum tempo, mas, principalmente, ver se eu agito o lance do Tenório Júnior com o pessoal de lá que sabe onde ele está”. Na época da entrevista, a informação mais recente que Elis tinha sobre o caso era que Tenório teria sido visto em uma prisão em La Plata. “É a informação mais recente que eu tenho, que eu passei pro pessoal, porque quem me deu essa informação foi um compositor de lá, que foi visitar alguém detido por algum motivo, em La Plata, e viu o Tenório”.

A compositora Joyce, autora da música que deu nome ao disco de Elis Essa Mulher, lançado em 1979, também nutre expectativa de esclarecimento sobre o que ocorreu com o músico. “Tenho esperança de que o caso Tenório venha a ser investigado na Comissão da Verdade”, escreveu em seu blog pouco após a instalação oficial da Comissão. “Tenório tinha uma inteligência impressionante, aquele humor ácido dos muito observadores, musicalidade à flor da pele. Tinha também 5 filhos e algumas compulsões, das quais, a longo prazo, precisaria se libertar. Mas não houve tempo”, escreveu Joyce, uma das entrevistadas para um documentário sobre o músico feito pelo cineasta Fernando Trueba. Com mais de 100 entrevistas realizadas, o projeto ainda não tem data para ser lançado.

Vinícius, Toquinho e mais alguns amigos como o poeta Ferreira Gullar, exilado em Buenos Aires, mobilizaram-se na busca do músico. Vinícius apresentou um recurso de habeas corpus à Justiça argentina e fez gestões junto à embaixada brasileira para obter alguma informação sobre seu paradeiro, mas não obteve sucesso. 

Operação Condor

Quem se encarregará da investigação do caso Tenório Júnior na Comissão Nacional da Verdade é o grupo  coordenado pela advogada Rosa Cardoso, que pesquisa a cooperação internacional entre os órgãos de informação e contrainformação dos países da América Latina sob regimes ditatoriais, em especial a Operação Condor. Oficializada em 1975 em uma reunião entre os governos ditatoriais em Santiago do Chile, a operação representou um acordo multilateral e sigiloso das Ditaduras  do Cone Sul  – Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai.

Documentos que vieram a público posteriormente comprovam que o Ministério das Relações Exteriores do Brasil e a embaixada em Buenos Aires tomaram conhecimento do sequestro de Tenório Júnior no dia 18 de março, por meio do  Plano de Busca Externa, montado no Brasil pelo Centro de Informações do Exterior  (Ciex) do Ministério das Relações Exteriores e considerado o embrião da Operação Condor.

Confissões de um torturador

Em 1986, o torturador argentino Claudio Vallejos, que integrava o Serviço de Informação Naval menciona o destino de diversos brasileiros nas mãos da ditadura argentina em entrevista à revista Senhor (nº 270), entre eles o de Francisco Tenório Jr. Vallejos afirma que participou da prisão, da tortura e teria sido testemunha do tiro fatal segundo ele desferido pelo comandante da Marinha na testa de Tenório, que estava prostrado no chão da cela após nove dias de tortura, da qul participaram, segundo Vallejos, três oficiais do Serviço Nacional de Informação brasileiro.

O militar atuou na repressão a presos políticos na Esma (Escola de Mecânica Armada), um dos maiores centros de detenção clandestina da Argentina durante a ditadura no país (1976-1983), onde cerca de 5 mil pessoas foram mortas e desaparecidas e participou do massacre de San Patricio.  e foi preso no Brasil em janeiro de 2012 por estelionato.

Documentos revelados por Vallejos apontam que no dia 20 de março de 1976 o Capitão Jorge Acosta solicita ao Contra-Almirante Chamorro autorização para “estabelecer contato com o agente de ligação, do SNI no Brasil”, para que informasse a central do Brasil que o grupo comandado por Acosta “estava interessado na colaboração para a identificação e informações sobre a pessoa do detido brasileiro Francisco Tenório Jr.”

Outro documento, em ofício assinado por Acosta datado de 25 de março de 1976, um dia após o golpe, é dirigido ao embaixador brasileiro em nome do “Chefe da Armada Argentina” anuncia a morte de Tenório. “Lamentamos informar a essa representação diplomática o falecimento do cidadão brasileiro Francisco Tenório Júnior,  Passaporte número 197803, de 35 anos, músico de profissão, residente na cidade do Rio de Janeiro. O mesmo encontrava-se detido à disposição do Poder Executivo Nacional, o que foi oportunamente informado a esta Embaixada”.

As correspondências estão entre os 205 documentos entregues à Comissão Nacional da Verdade pelo presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke que segundo ele mostram o papel protagonista do Brasil na cooperação cívico-militar entre as ditaduras nesses países.

Vallejos veio morar no Brasil na década de 80 e foi preso no Brasil em janeiro de 2012  acusado de estelionato. A morte de Tenório Jr. está sob investigação formal na Argentina  pelo  procurador federal argentino, Miguel Angel Osorio, que pediu a extradição de Claudio Vallejos para a Argentina. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em outubro passado, por unanimidade extraditar o argentino, mas ele permanece no Brasil a espera de que a Justiça argentina venha buscá-lo.

 

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