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É preciso acabar com a estigmatização da mulher negra no Brasil, diz consulesa

Criado em 23/11/15 16h30 e atualizado em 23/11/15 18h46
Por Repórter Brasil

"Todos os dias eu experimento o racismo", declarou a consulesa da França em São Paulo, Alexandra Baldeh Loras, durante entrevista concedida ao Repórter Brasil, por ocasião da Marcha Nacional das Mulheres Negras, em Brasília, na última quarta-feira (17).

Casada com o cônsul geral da França, Damien Loras, de 44 anos, e mãe de Rafael, de 2, a jornalista formada em ciências políticas está há dois anos no país e diz vivenciar o racismo até mesmo na residência consular. "O protocolo francês faz questão que eu fique na entrada para dar as boas-vindas aos convidados do consulado e muitas vezes têm pessoas que passam na minha frente achando que sou uma funcionária. E também se eu fosse funcionária, gostaria de não ser invisível." Ela também conta que comumemente as pessoas questionam sua nacionalidade pelo fato de ser negra. "Já com a minha legitimidade de ser uma consulesa da França, pelo fato de ser negra, muitas vezes as pessoas questionam: 'Mas você é francesa mesmo? Mas você cresceu na França? Sim. Mas onde você nasceu? Em Paris. Mas antes? Antes de quê?"

Confira a entrevista na íntegra:

Segundo Loras, o que mais a surpreende no país são as atitudes racistas veladas e aceitas culturalmente em nossa sociedade. "Um negro bom é o negro que conhece o seu lugar e isso me choca porque, de uma certa forma, é um racismo estrutural, muito sutil, que foi incrementado na cultura brasileira e vem da herança da escravidão", diz ela fazendo referência ao fato de o Brasil ter sido o último país a abolir a escravidão no planeta, quase cem anos após os Estados Unidos.

Ela também relata que às vezes gosta de se vestir com roupas brancas, mas que, culturalmente, no Brasil, as pessoas tendem a associar negros vestindo de branco a babás ou serviçais. "Eu gosto de me vestir de branco, então, tem essa coisa de ser confundida com a babá. E se não estou vestida de branco e vou a um clube de elite, as pessoas acham que eu deveria estar de branco [identificada como serviçal]. Então tem muitas coisas veladas e coisas que não são tão veladas".

Sobre a estigmatização da mulher negra, ela diz que a nossa sociedade melhorou, mas que ainda há muitas coisas a serem feitas nessa área. "Olha o que acontece nas novelas brasileiras: a mulher negra é muitas vezes ou a faxineira ou a amante que destrói o casamento dos ricos brancos.Essa estigmatização faz com que, em 85% das vezes, crianças negras de menos de 5 anos escolham a boneca branca como a linda e a boazinha e a negra, como a feia e má", aponta ela, que também ressalta o papel das discussões sobre racismo levantadas por ocorrências envolvendo personalidades negras famosas. "Tem milhares de Taís Araújo, temos milhares de Maju enfrentando o racismo todos os dias. Mas elas não têm voz na mídia. Então achamos que não existe. Mas claro que existe e precisamos mudar essa estigmatização."

Questionada sobre ser favorável às cotas, a consulesa afirmou esta ser uma forma triste de equiparar os direitos dos negros dentro da sociedade, mas que sem elas tampouco teríamos algum avanço. "E claro, estou a favor das cotas porque, por mais que seja humilhante, que seja a pior forma de reequilibrar, mas, infelizmente, se estudamos o Brasil, faz 127 anos que não temos cotas ou temos cotas para mulheres, pessoas com deficiência ou cotas para filhos de fazendeiros, com a Lei do Boi, mas quando são cotas para os negros é como uma coisa visceral do dono da senzala falando 'não, não vamos deixar os negros conquistarem um passo adiante".

Ela lembra a questão das cotas nos Estados Unidos como um dos fatores que permitiram àquele país, onde a questão racial era mais problemática, permitirem a ascensão dos negros em vários segmentos da sociedade. "temos que nos lembrar que, nos Estados Unidos, 60 anos atrás, a situação era pior. Não podíamos andar, entrar nos mesmos ambientes, restaurantes ou banheiro, nem podíamos sentar nos mesmos assentos nos ônibus, e em 60 anos de cotas e de ações afirmativas implantadas de maneira firme, vimos resultados como Barack Obama e Oprah Winfrey, a mulher mais rica dos Estados Unidos, e o negro entrou em todo o especto da sociedade lá, como o asiático e o latino, etc. Claro que precisamos implementar cotas e penalizar a USP [Universidade de São Paulo], que acho um absurdo, que [mesmo] com a lei, ela não tem cotas para os negros, quando ela é a universidade que precisa mais mostrar isso, porque é a melhor universidade do Brasil e é pública."

Creative Commons - CC BY 3.0

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