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Evidências de desvio de recursos – e as suas consequências – são encontradas fartamente dentro das escolas do Pará

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Sindicato tenta reunir provas de desvio de verbas da Educação no Pará

Criado em 28/08/12 12h17 e atualizado em 28/08/12 14h39
Por Ana Aranha Fonte:Agência Pública

Escola no Pará funciona ao ar livre, sem piso e estrutura adequada
Evidências de desvio de recursos – e as suas consequências – são encontradas fartamente dentro das escolas do Pará (Foto: Agência Pública)

O Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública no Pará reuniu relatos dos professores, notas fiscais, repasses com as descrições do convênio e acionou diversas instâncias de investigação para provar o desvio de verbas ao menos nesse caso do curso de capacitação. A Câmara dos Vereadores abriu uma Comissão Parlamentar de Inquérito e, em agosto de 2008, cassou o mandato do prefeito Edson Barros, então do PP.

Em sua defesa, o prefeito argumentou que o convênio foi inteiramente cumprido. Segundo ele, o erro da secretaria de educação teria sido meramente formal: esqueceram de passar a lista de presença e de fazer o recibo para os kits e hospedagem.

O argumento convenceu a Justiça Estadual, que concedeu liminar para ele voltar ao cargo – onde permanece até hoje. Esse ano, tenta eleger sua vice-prefeita pelo PSD (partido criado em 2010 por Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo).

Desde então, Doca vem colecionando documentos sobre desvios de verba da educação de Anajás – e que não se restringem ao episódio do curso. Ele já tem duas pastas cheias. Há dezenas de cartas assinadas por professores e funcionários da educação à Polícia Federal e ao Ministério Público pedindo ajuda e sigilo.

Uma das cartas denuncia o desvio de recursos no fornecimento de alimentos às creches municipais. Segundo os funcionários, as creches Luluzinha e Bolinha nunca receberam os 3 fardos de frango, 24 maços de couve-flor e 250 litros de leite que constam na planilha de prestação de contas assinada pelo secretário de finanças da cidade. A alimentação servida para as crianças costuma ser macarrão, sopa, mingau e biscoito.

Outro documento aponta  superfaturamento da merenda para os alunos mais velhos.  Na planilha da prefeitura, o suco de caju vale R$ 5,20 a unidade, enquanto no mercado local o mesmo suco custa R$ 2.

Parte dessas denúncias foram investigadas pela Controladoria Geral da União, que enviou uma equipe para passar um pente fino nas contas públicas de Anajás em 2010. Foram 42 constatações de irregularidades, que estão sendo investigadas pelo Ministério Público Federal do Pará.

E ainda há denúncias que ficaram de fora do relatório. Pública entrevistou diversos funcionários que dizem que a prefeitura não repassa ao INSS as contribuições descontadas de seus salários. Pelo menos dois professores mostraram à reportagem suas folhas de pagamento com os descontos mensais e o documento de consulta oficial no INSS, onde consta que sequer existe um cadastro em seu nome.

“Fui a um advogado previdenciário, ele disse que isso é crime de apropriação indébita”, diz uma professora, que não quer se identificar. Ela precisa do benefício para um tratamento médico, mas teme sofrer represálias se entrar com uma ação. “Eles me transferem para uma escola rural a dois dias da cidade, não quero ficar longe dos meus filhos”.

Na pasta de Doca, há algumas cartas falando sobre a chegada da fiscalização da CGU. Depois que a controladoria avisou a prefeitura que suas contas passariam pelo pente fino, observou-se uma movimentação atípica na cidade. “Assim que foi divulgado o sorteio, vimos um mutirão de contadores e técnicos em contabilidade vindo e voltando de avião, trazendo documentos e levando para Belém. Asseguro que foram mais de 10 fretes de aeronaves nesse período, como também amanheciam e anoiteciam no setor de contabilidade da prefeitura”, diz uma das cartas enviadas à Polícia Federal sobre o episódio.

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Prefeitura tenta calar professores
A maior parte das denúncias é anônima pois as pessoas temem retaliação. Funcionários dizem que sofreram coação para assinar documentos atestando a chegada de materiais que nunca viram. “Em Anajás a gente tem escolha, assina o recibo ou a carta de demissão”, ironiza um professor.

Além de presidente do sindicato, Doca faz parte do conselho do Fundeb, responsável por fiscalizar a aplicação de recursos e aprovar as contas do fundo. Mas ele diz que não é convocado para uma reunião há mais de um ano. “Teve uma vez que eles me esperaram sair da cidade por uma semana para convocar uma reunião às pressas. Agora estou sempre aqui, não sei como estão aprovando as contas”, diz.

“Se tem alguém aprovando as contas de Anajás, não é o conselho”, diz outro membro do conselho que não quer se identificar. Essa denúncia foi encaminhada ao Tribunal de Contas do Estado, em Belém, há dois anos.

O prefeito e a secretária de educação não foram localizados para responder às denúncias. Segundo o diretor de ensino da cidade, Silas de Jesus, eles estavam viajando pelo interior, onde não pega celular. Segundo Silas, o conselho não se reúne porque os membros têm outras atividades remuneradas e não vão às reuniões.

Doca, que já foi demitido duas vezes e está há cinco anos à frente do Sintepp, não esconde a frustração. “Estou desanimado. Vamos ver se aparece outra pessoa para continuar”, diz, e explica: “Já cansamos de enviar todas essas informações para a Justiça, Polícia Federal, Ministério Público, Ministério da Educação. E nada acontece”.

Em Portel, os conselhos também não funcionam como deveriam. “Em um ano, não vimos uma prestação de contas”, diz Roseane Gonçalves Silva, representante dos funcionários no conselho do Fundeb de Portel.

Ela leva sua câmera fotográfica sempre que o grupo vai visitar as escolas e anota todos os problemas que não podem ser maquiados: salas pequenas, sem segurança, abafadas, escuras. “No interior é mais difícil, só vamos quando a secretaria dá transporte. Mesmo assim, são muitas irregularidades”, diz.

Aos 26 anos, Roseane é formada em pedagogia e está fazendo pós-graduação em gestão escolar. Trabalha como auxiliar de secretária. Ela sabe que dificilmente será convidada pela prefeitura para um cargo melhor, mas pretende entrar por um concurso.


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A série “O Futuro da Amazônia” tem o apoio da Fundação Carlos Chagas

Creative Commons - CC BY 3.0

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