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Trabalho infantil doméstico é o mais difícil de combater

Criado em 01/10/12 11h31 e atualizado em 01/10/12 11h48
Por Ana Aranha Fonte:Agência Brasil

Educação e trabalho infantil no Pará - Iara
Em busca de estudos, Iara deixou a casa dos pais aos 14 anos e se tornou empregada doméstica (Foto: Ana Aranha/Agência Pública)

Há poucos mecanismos de fiscalização para o trabalho doméstico infantil. “Sabemos do isolamento psicológico, submissão, que tem criança que acaba escravizada. Mas não podemos fiscalizar porque somos vedados de entrar nas residências”, afirma Deise Mácola, coordenadora da fiscalização do trabalho infantil na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Pará.

As poucas denúncias sobre trabalho infantil doméstico recebidas por Deise são encaminhadas ao Ministério Público do Trabalho, que tem autorização para entrar nas casas. Segundo o procurador Rafael Marques, que coordena essas fiscalizações, as famílias flagradas reagem sempre com surpresa. “Eles se assustam, entendem que estavam fazendo um bem por dar teto e comida à criança”, afirma. Nas entrevistas com as vítimas, porém, o procurador ouve relatos de humilhação, isolamento, violência e até assédio sexual.

A família flagrada por explorar trabalho infantil é obrigada a levar a criança de volta para a sua casa. Mas não há uma punição. A lei estabelece sanções para empresas, mas não para pessoas físicas.

“Essa questão está adormecida dentro das políticas públicas na nossa região. Há uma tolerância enorme em relação às crianças que trabalham”, diz Roseane Costa de Souza, diretora da divisão de Assistência Social dentro da Secretaria Estadual de Assistência Social do Pará.

Enquanto os números do trabalho infantil caem em todo o país, na região norte, e especialmente no Pará, o problema cresce. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), a região foi a única a registrar aumento no percentual de crianças e adolescentes trabalhando entre 2009 e 2011. Todas as outras tiveram queda.

A comparação entre o Censo 2010 e 2000 é preocupante. O Pará teve o segundo maior aumento na quantidade de pessoas de 10 a 13 anos engajadas em atividades econômicas do país. Em uma década, o estado registrou um acréscimo de 12 mil crianças e adolescentes no mercado, um crescimento de 28% em relação a 2000.

A maior dificuldade no combate ao trabalho infantil no Pará é a barreira cultural, acredita Sueli Mendonça, coordenadora Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil no estado. “Sempre que colocamos o tema em reuniões ou palestras, as pessoas têm uma reação contra muito forte, elas contam com orgulho sobre como trabalharam desde cedo e conseguiram progredir”, afirma. É difícil quebrar o ciclo.

As meninas que trabalham como domésticas também são as que menos recebem benefícios de políticas de assistência social.

O primeiro entrave são as distâncias. Em pesquisa feita em Belém sobre os locais de origem das meninas que trabalham como domésticas, o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Emaús identificou três cidades, duas na Ilha de Marajó. Na segunda etapa do projeto, as escolas dessas cidades receberiam cursos de prevenção e os próprios alunos montariam peças de teatro sobre trabalho infantil. Mas uma das cidades identificadas na ilha, Breves, fica a 12 horas de barco de Belém. Devido à distância, o centro teve de escolher outro município para receber o projeto.

A prevenção no interior é fundamental porque, em geral, essas meninas já trabalhavam em casa antes na mudança: na roça, no beneficiamento da farinha de mandioca e, principalmente, na colheita do açaí. Como a palmeira do açaí é fina e alta, os adultos podem tombar a árvore quando sobem. Por isso, as crianças de sete a doze anos são chamadas para subir na árvore e colher o cacho.

“Elas sobem com a faca enfiada na cintura, tem muitos acidentes”, afirma Luiz Carlos Figueiredo, gerente do Centro de Referência Especializada que monitora esses casos dentro da secretaria de assistência social. Ele ressalta que, durante o atendimento, os hospitais não registram que o acidente foi fruto de trabalho infantil. Assim, as crianças voltam a trabalhar mesmo depois do acidente.

Leia também as outras duas reportagens da série:
Meninas se mudam para estudar em Belém e trabalham como empregadas domésticas
Um orgulho raro: o futuro da Amazônia
Corrupção prejudica a educação na Amazônia


Início precoce
Iara era tão pequena que nem lembra quando começou a colher açaí. No fim do dia na casa dos pais, vencia quilômetros com as latas da fruta na cabeça e ia dormir com dor nas costas. “Eu achava que ia ficar velha rápido trabalhando assim, com sol ou com chuva, isso acaba com a gente”, ela lembra.

A menina trabalhava sempre que não estava na escola, e essas ocasiões estavam se tornando cada vez mais frequentes nos anos antes da mudança para Belém. “Lá é interior do interior, os professores davam aula um mês e depois ficavam  vários sem aparecer”, ela lembra.  Aos 13 anos, Iara ainda não sabia ler.

Na região norte, um dos maiores catalizadores do trabalho infantil é a deficiência da rede pública de educação, principalmente no interior e comunidades ribeirinhas. Essa é uma das interpretações de Renato Mendes, coordenador do programa de combate ao trabalho infantil da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Até a década de 90 e começo dos anos 2000, a pobreza era a causa fundamental. Com a melhoria do acesso à renda, percebemos a falta de acesso e a baixa qualidade da educação como os novos determinantes para o trabalho infantil”, afirma.

Iara diz que a busca pelos estudos foi o único fator que a fez deixar a casa dos pais. “Foi a professorinha mesmo que deu a ideia pro papai, porque ela viu que eu queria aprender”, lembra.

Quando saiu de casa, todos os vizinhos já tinham mandado pelo menos um filho para a capital “para estudar e trabalhar”. “Trabalhar porque as pessoas não vão receber ninguém de graça, né? Mas eu vim mesmo pra estudar”.

Creative Commons - CC BY 3.0

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