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atalina da Silva Messiaas, gestora da escola Estadual Indigena Padre José de Anchieta, e integrante da OMIR (Organização das Mulheres Indígenas de Roraima), mostra a escola na Comunidade Indigena do Barro na região do Surumu

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Indígenas usam educação como ferramenta para recuperar tradições culturais

Criado em 16/04/13 19h59 e atualizado em 16/04/13 21h12
Por Luciano Nascimento Edição:Tereza Barbosa Fonte:Enviado especial da EBC

 

Escola na Raposa Serra do Sol
atalina da Silva Messiaas, gestora da escola Estadual Indigena Padre José de Anchieta, e integrante da OMIR (Organização das Mulheres Indígenas de Roraima), mostra a escola na Comunidade Indigena do Barro na região do Surumu (Wilson Dias/Agência Brasil)

Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR) – “Morîîpe erepantî”. É com esta saudação que os visitantes são recebidos na Escola Estadual Padre José de Anchieta, uma das duas existentes na comunidade do Barro. A saudação significa “sejam bem vindos” na língua macuxi e revela um novo entendimento no processo de educação dos povos indígenas.

Cerca de 250 alunos de diferentes comunidades de Raposa Serra do Sol cursam da 1ª à 9ª séries do Ensino Fundamental. A escola também oferece turmas na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA). De acordo com a gestora da escola, Natalina da Silva Messias, além do português, os alunos são alfabetizados nas línguas macuxi e taurepangue. Ela conta que esta foi uma das muitas conquistas dos povos de Raposa Serra do Sol nos últimos anos. O ensino dessas línguas tem contribuído para a retomada da cultura dos povos que habitam a região.

“Pra nós, o ensino das línguas indígenas tem o mesmo peso da língua portuguesa, o mesmo valor de outras línguas. É um compromisso da gestão [escolar], de fortalecer a cultura, a língua, a dança dos povos da região”. Antes, os índios eram desestimulados a falar as suas línguas, “porque foi ensinado, repassado pra gente que a língua indígena era uma gíria, que ela era inferior”, conta a gestora.

Atualmente, a língua indígena é ensinada no contra turno das aulas. As crianças já são alfabetizadas no português e no macuxi ou taurepangue. Adolescentes que até pouco tempo praticamente não falavam as suas línguas também são alfabetizados. “Nós trabalhamos a língua indígena no horário oposto, no primeiro nível que é a alfabetização. O segundo nível é aquele que já ouve, já escreve, porque já aprendeu com o pai. Alguns deles já sabem porque o pai é falante [da língua indígena], então nós dividimos”, conta Natalina.

A metodologia não distingue a série que os alunos estão cursando. Além disso, a escola desenvolve O Projeto Musicar, em que os alunos traduzem músicas do português para o macuxi. “Ele pode estar lá no ensino médio, mas se ele não sabe nada, vai para a alfabetização na língua. Os alunos do segundo nível já começaram a traduzir algumas músicas do português”

Segundo Natalina, a escola ganhou 10 violões e os alunos também começam a produzir alguns cantos, a traduzir na língua macuxi, que é predominante. “Agora eles já iniciaram a tradução do Hino Nacional para o macuxi. Então é assim que nós estamos implementando”.

Os mais velhos também contribuem para o aprendizado. Eles são convidados para falar sobre os costumes antigos, ensinam as danças e reproduzem os rituais. “A língua não se dá só falando, né?! Mas é ouvindo a história do nosso povo, a luta, toda essa caminhada. Então, hoje a gente já tem o professor, como nós falamos, específico de línguas, né, que conhece, trabalhando a metodologia indígena”.

Natalina lembra que a Comunidade Barro ainda tem o pajé. “[Ele] sabe de infinitas músicas na língua macuxi. Ele vem pra cá, nos ajuda, a fazer o trabalho... Porque o indígena é assim, eu aprendi com meu povo, a gente canta na tristeza, a gente canta na alegria, então a gente vai conquistando e aprendendo”.

Natalina explica que a mudança foi uma determinação da comunidade, que entendeu o potencial da educação na preservação dos costumes e, por isso, conta com o apoio de todos. "Lá também estamos ensinando nossa língua e nossos costumes".

A escola reflete uma concepção adotada nas outras comunidades de Raposa Serra do Sol, com a diferença de que dispõe de uma boa estrutura física para os padrões da região: estrutura em alvenaria, quadra, sala de informática. Uma preciosidade em um local em que, normalmente os índios é que acabam se responsabilizando pela construção dos locais de ensino.

“Isso daqui é um avanço na escola indígena, né? Os nossos alunos estão tendo acesso à internet, estão pesquisando. O que a gente trabalha muito é a pesquisa. Ir buscar onde? E como? E nossos alunos estão tendo esse privilégio que não é um luxo, é uma necessidade”, observa a gestora.

Justamente em razão dessa necessidade, foi criada a Organização dos Professores Indígenas (Opir), cuja missão é buscar melhorias na educação dos povos indígenas do Estado de Roraima. O presidente da Opir, Telmo Raposo, lembra que apesar de a Lei de Diretrizes e Bases de 1996 garantir aos índios o acesso à educação especializada, com programas e currículos específicos para a comunidade, muito ainda precisa ser feito.

“A educação é uma das chaves para o fortalecimento das comunidades indígenas. Ao longo desses anos, o movimento indígena conquistou espaços na gestão da educação escolar e avançou na formação de professores indígenas. Porém, constatamos que o sistema educacional não entende ainda as demandas específicas dos povos indígenas”.

Antes, os índios só conseguiam estudar até o ensino médio e não havia a formação de professores indígenas habilitados para o ensino. Isto era um fator que dificultava o ensino da língua e dos costumes, contou Telmo Raposo à Agência Brasil. “Com muito custo só conseguiam fazer o magistério”.

Em 2000, buscando solucionar essa questão, a Opir apresentou uma pauta de reivindicação para a Universidade Federal de Roraima, na qual pleiteava reais condições de acesso dos indígenas ao ensino superior e a consequente permanência. Dessa pauta surgiu o Insikiran, núcleo de ensino superior indígena ligado à Universidade Federal de Roraima (UFR), criado em 2001.

Hoje, cerca de 200 estudantes das etnias Macuxi, Wapixana, Taurepang, Wai-wai, Ingarikó e Yekuana frequentam o curso de Licenciatura Intercultural. O curso tem quatro anos e meio de duração e forma professores indígenas para os ensinos fundamental e médio. Entre as contribuições do Insikiran está a elaboração de materiais pedagógicos nas línguas indígenas. A exemplo do dicionário de macuxi.

Agora a organização pleiteia melhorias nas condições estruturais das escolas e também a elaboração de um planejamento pedagógico que atenda aos anseios das comunidades. Em março, durante a 42ª Assembleia dos Povos Indígenas de Roraima, eles lançaram um documento no qual reivindicam “a criação de um sistema próprio para Educação Escolar Indígena, garantindo assim a desvinculação e gerenciamento dos recursos financeiros nas três esferas governamentais.

No documento, eles também argumentam que “a estrutura das escolas nas comunidades indígenas se encontra em condições precárias e indignas, com as aulas ministradas embaixo de árvores, sem material didático, falta de cadeiras e de outros itens indispensáveis”.

Segundo o Conselho Indígena de Roraima (CIR), nas escolas de Raposa Serra do Sol trabalham perto de 500 professores que atendem aproximadamente 7 mil estudantes. De acordo com Telmo Raposo, a próxima etapa é conseguir que os índios consigam se formar em outras profissões, além da área pedagógica. “Hoje a gente vê assim: gente, na formação da pedagogia a gente tem muito. A gente também quer que ver os índios se formando em direito, medicina, engenharia e outras profissões”.

Edição: Tereza Barbosa

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