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Na pintura Mercado na Rua do Valongo, o pintor francês Jean Baptiste Debret retrata o mercado de escravos no Rio de Janeiro

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Empresária conta como descobriu cemitério de escravos, ao reformar casa

Criado em 14/09/13 17h32 e atualizado em 15/09/13 01h23
Por Flávia Villela Edição:Denise Griesinger Fonte:Agência Brasil

 

Rio de Janeiro – Empresária do ramo da dedetização, Ana Maria de la Merced Guimarães, nunca imaginou que a compra do imóvel na rua Pedro Ernesto, nº 36, no bairro da Gamboa, zona portuária do Rio, mudaria radicalmente sua vida, a de seu marido, Petruccio, e das três filhas. Em 1996, durante uma reforma, a família descobriu ossadas debaixo da casa. A princípio, desconfiou que fossem de cachorros, até encontrarem várias arcadas dentárias humanas.

“Quando encontrei uma arcada dentária de criança fiquei assustada. Pensei em uma chacina, que alguém havia matado a própria família. Pensei o pior. Liguei para minha advogada, que ligou para um delegado. Depois, com a cabeça fria, lembramos que a Gamboa é uma região histórica”, contou.

A casa de Merced e dezenas de outras casas do bairro haviam sido construídas por cima de um cemitério de escravos do século 17. Após pesquisas e estudos dos artefatos, descobriu-se que a maioria dos mortos enterrados eram crianças e pré-adolescentes. Por esse motivo, o cemitério ficou conhecido como Pretos Novos (criado em 1769 e extinto em 1830). Lá foram enterrados, em covas coletivas, escravos que não resistiam à longa viagem nos navios negreiros vindos da África.

“Este cemitério era conhecido por poucos, esquecido por todos. Um passado funesto, mas importantíssimo para a nossa cidade. Isto representa o holocausto negro. Aqui embaixo estão enterradas milhares de pessoas. A maioria pré-adolescente. Isto aqui representa um crime contra a humanidade e não pode ser esquecido”, declarou Merced. Além das ossadas, também foram encontradas cerâmicas e conchas.

A notícia sobre a existência de um cemitério de escravos acabou atraindo visitantes do Brasil e de outros países interessados em saber mais sobre a história envolvendo as mortes e o local. “Passamos a abrir a casa para pesquisadores, estudantes, jornalistas, uma média de dez a 15 pessoas por mês”. Novos amigos surgiram, assim como a admiração pelos artefatos e pela história.

Em 2005, ela e o marido compraram mais dois terrenos na mesma rua, um deles se tornou a sede do Instituto de Pesquisa e Memória dos Pretos Novos, fundado naquele ano por Merced, amigos e estudiosos do tema. Dezessete anos depois, Merced e o marido são responsáveis pela manutenção e promoção do instituto, que é também uma galeria de arte e um museu memorial.

Em 2011, mais uma surpresa: na busca por mapear o cemitério, arqueólogos descobriram um sambaqui, sítio pré-histórico formado pelo acúmulo de conchas, moluscos, ossos humanos e animais de mais de 3 mil anos e vestígios do primeiro encontro entre indígenas Tupinambás e portugueses que aqui chegaram pela primeira vez.

A dedicação à causa custou à família sacrifícios que emocionam Merced até hoje. “Fomos proibidos de fazer a obra e, em 1998, tivemos que sair correndo da casa, que ameaçava desabar por causa das escavações e das chuvas. Minhas filhas, na época adolescentes, tiveram que morar em um abrigo na nossa empresa até 2001”, contou entre lágrimas. “Isso ficou nas nossas mãos sem ninguém assumir esta responsabilidade”.

Hoje, o local também conta com um núcleo de pesquisa e oficinas de história sobre os pretos novos. Em 2012, mais de mil pessoas participaram das atividades promovidas pelo núcleo. A Companhia de Desenvolvimento Urbano e Portuário da prefeitura contribui com um pequeno aporte para cobrir os gastos com conta de luz, água e limpeza. A maior parte das receitas vem de doações e do bolso da família. A manutenção das janelas arqueológicas e produção de folhetos explicativos também são de responsabilidade da prefeitura, mas quem cuida e mantém aberto o lugar é Merced e o marido.

Edição: Denise Griesinger

Creative Commons - CC BY 3.0

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