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Rubens Paiva e a esposa, Eunice, na cidade de Brasília em 1960

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Ouça áudio exclusivo em que Rubens Paiva defende governo Jango no dia do Golpe de 64

Criado em 17/03/14 19h18 e atualizado em 01/04/16 10h50
Por Leandro Melito Edição:Edgard Matsuki / Leyberson Pedrosa Fonte:Portal EBC*

Na madrugada do dia 1º de abril de 1964 (com o Golpe Militar em andamento desde o dia anterior), Rubens Paiva, deputado federal por São Paulo, fez um apelo ao vivo pela Rádio Nacional em defesa da legalidade do presidente João Goulart. O áudio está disponibilizado com exclusividade no Portal EBC. 

Ouça o áudio histórico de Rubens Paiva no dia 1º de abril de 1964 na íntegra:

Creative Commons - CC BY 3.0 -

Durante a declaração, o deputado criticou abertamente o então governador de São Paulo, Ademar de Barros, um dos apoiadores do Golpe.

"Me dirijo especialmente a todos os trabalhadores, todos os estudantes, e a todo o povo de São Paulo tão infelicitado por este governo fascista e golpista que neste momento vem traindo seu mandato e se pondo ao lado das forças da reação".

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O deputado convocou estudantes e trabalhadores a acompanharem as transmissões da Rádio Nacional, que formava uma rede em defesa da legalidade junto a outras emissoras.

"Estejam atentos às palavras de ordem que emanarem aqui da Rádio Nacional e de todas as outras rádios que estejam integradas nesta cadeia da legalidade. Julgamos indispensável que todo o povo se mobilize tranquila e ordeiramente em defesa da legalidade prestigiando a ação reformista do presidente João Goulart que neste momento está com o seu governo empenhado em atender todas as legítimas reivindicações de nosso povo".

 

Rubens Paiva e a esposa, Eunice, na cidade de Brasília em 1960
Rubens Paiva e a esposa, Eunice, na cidade de Brasília em 1960 (Acervo Família Rubens Paiva/Divulgação)

"Está lançada inteiramente para todo o país o desafio: de um lado, a maioria do povo brasileiro desejando as reformas e desejando que a riqueza se distribua, os outros são os golpistas que devem ser repelidos e desta vez, definitivamente para que o nosso país veja realmente o momento da sua libertação raiar".

Foi dessa maneira que Paiva concluía a sua intervenção pela rádio, em que convocava a resistência pacífica contra o Golpe.

Na madrugada do dia 03 de abril, Paiva ainda providenciou um avião para levar o ministro da Casa Civil, Darcy Ribeiro, e o Procurador-Geral da República, Waldir Pires - que tentavam a resistência em Brasília - para o Rio Grande do Sul, onde Jango tentava ainda articular forças para resistir ao Golpe. No meio do trajeto eles souberam pelo rádio que não haveria resistência e, assim como o presidente, rumaram para o exílio no Uruguai

No dia 10 de abril, com os militares já no poder,  Rubens Paiva teve seu mandato cassado após a edição do primeiro Ato Institucional (AI-1) . Eleito em 1962 para o mandato parlamentar, Rubens Paiva teve papel de protagonismo na CPI que investigou o IBAD (Instituto Brasileiro de Ação Democrática), cuja conclusão apontava a intervenção da entidade “no processo de escolha de representantes políticos do povo brasileiro para a tomada do poder através da corrupção eleitoral”.

Família de Rubens Paiva
Creative Commons - CC BY 3.0 - Família de Rubens Paiva

 

Em 1971, entre os dias 20 e 22 de janeiro, o deputado entrou para a lista dos mortos e desaparecidos políticos da ditadura militar brasileira (1964-1985). "Esse era o bravo Rubens, trucidado pela ditadura, especificamente pelo serviço de repressão da ditadura, creio que do Exército. Rubens era um homem muito forte, devem ter usado de violência extrema para quebrar suas forças e matá-lo. , anotou Darcy Ribeiro em suas memórias.

Conclusões do caso Rubens Paiva

O relatório final da Comissão Nacional da Verdade aponta como responsáveis pela morte de Rubens Paiva integrantes do Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (Cisa), do Centro de Inteligência do Exército (Cie) e do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi) do I Exército no Rio de Janeiro em 1971. Entre as violações apontadas no relatório aparecem sequestro, tortura, desaparecimento forçado, ocultação de cadáver e homicídio doloso.

Segundo a CNV o ex´-deputado provavelmente foi executado nas dependências do Doi-Codi do I Exército". "Por meio das investigações realizadas pela CNV, como a oitiva de militares do 1º Batalhão de Polícia do Exército (BPE), constatou-se que oficiais daquele batalhão foram testemunhas da morte sob tortura de Rubens Paiva no Doi-Codi", aponta o relatório.

Responsáveis

Foram apontados como participantes da morte do deputado o brigadeiro João Paulo Burnier (Cisa);  major Rubens Paim Sampaio e o capitão Freddie Perdigão Pereira (Cie); e os integrantes do Doi-Codi comandado por José Antônio Nogueira Belham: capitão Raymundo Ronaldo Campos,  tentente médico Amilcar Lobo Pereira da Silva, sargentos Jurandyr Ochsendorf e Souza e Jacy Ochsendorf e Souza e o agente Antônio Fernando Hughes de Carvalho.

Julgamento

Os ex-militares José Antonio Nogueira Belham, Rubens Paim Sampaio, Jurandyr Ochsendorf e Souza, Jacy Ochsendorf e Souza e Raymundo Ronaldo Campos que atuaram na ocultação do cadáver de Rubens Paiva estão respondendo pelo crime em processo da 4ª Vara Criminal do Rio de Janeiro. Suspenso em setembro de 2014 pelo ministro Terori Zavascki a pedido dos advogados dos militares, o processo foi retomado pelo STF cerca de um ano depois a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Prisão e tortura

Na manhã do dia 20 de janeiro de 1971 o ex-deputado Rubens Paiva, então com 41 anos teve sua casa invadida por seis agentes, armados com metralhadoras e levado em seu próprio carro para prestar depoimento no quartel da 3ª Zona Aérea, ao lado do aeroporto do Galeão, comandado pelo tenente-brigadeiro João Paulo Moreira Burnier. Lá o ex-deputado sofreu as primeiras torturas, segundo o relatório da CNV. Horas antes, ainda na madrugada, Cecília de Barros Correia Viveiros de Castro e Marilene de Lima Corona haviam sido detidas no aeroporto quando retornavam do Chile com cartas de exilados, uma delas endereçada a Rubens Paiva.

Os três foram levados pela equipe do Cisa para o Doi-Codi, na rua Barão de Mesquita, na Tijuca. A informação consta do documento "Turma de Recebimento", que estava entre o material  encontrado pela Polícia Civil do Rio Grande do Sul na casa do coronel Júlio Miguel Molina Dias, assassinado em 1º de novembro de 2012.

A prisão de Paiva foi registrada no informe  nº 70, da agência do Rio de Janeiro do SNI (Serviço Nacional de Informações), com data de 25 de janeiro de 197. “[...] Rubens Beyrodt Paiva foi localizado, detido e levado para o QG da 3ª Zona Aérea e de lá conduzido juntamente com Cecília [de Barros Correia Viveiros de Castro] e Marilene [de Lima Corona] para o Doi".

Na documentação estavam registrados os pertences do deputado no momento da prisão, entre eles "quatro cadernos de anotações", que se encontravam com o major Belham. Em  junho de 2013, o general da reserva Belham compareceu à CNV para prestar esclarecimentos e alegou que estava de férias em 21 de janeiro de 1971, apontado como dia provável da morte de Rubens Paiva.

A folha de alterações funcionais do ex-militar de 1º de janeiro a 30 de junho de 1971, mostram que nesse período o militar fez deslocamentos sigilosos. "É importante assinalar que o dia 20 de janeiro de 1971, data em que Belham interrompeu suas férias para realizar deslocamento sigiloso com saque de diárias, corresponde ao dia em que Rubens Paiva foi levado, no final do dia, ao DOI do I Exército, no Rio de Janeiro (RJ).", aponta o relatório da CNV.

Segundo testemunhos do coronel Ronald Leão, falecido em novembro de 2013, Rubens Paiva foi recebido no Doi do I Exército junto de Cecília e Marilene pelos agentes do Cie Freddie Perdigão Pereira e Rubens Paim Sampaio, "onde passam a ser interrogados sob tortura", registra o relatório. 

Torturador homenageado

Os depoimentos de Leão e de um de seus subalternos no Doi naquela época - cujo anonimato foi preservado pela CNV -  permitiram à Comissão reconhecer um dos agentes que participaram da tortura de Paiva como Antônio Fernando Hughes de Carvalho, que chegou a ganhar uma medalha em 5 de novembro de 1971, “como uma homenagem especial do Exército, pelos assinalados serviços prestados no combate à subversão, colaborando dessa forma, para a manutenção da lei, da ordem e das instituições”.

Desaparecimento

Em 1986, em resposta a denúncia anônima, o então secretário de Segurança do estado do Rio de Janeiro, Nilo Batista, determinou que se realizasse escavação em praia do Rio de Janeiro para a busca dos restos mortais de Rubens Paiva. Uma ossada com características que poderiam ser do ex-deputado foi enviada ao Instituto Médico Legal (IML),  mas um laudo da Polícia Federal alegou se tratar da ossada de um animal, o que gerou a suspeita de que os restos mortais foram trocados.

Paulo Malhães 

Paulo Malhães depõe na Comissão Nacional da Verdade
Creative Commons - CC BY 3.0 - Paulo Malhães depõe na Comissão Nacional da Verdade

 

No dia  20 de março deste ano, o coronel reformado Paulo Malhães afirmou em declarações ao jornal O Dia ter sido incumbido da missão de esconder o corpo do ex-deputado.

"Procuramos até que se achou [o corpo], levou algum tempo. Foi um sufoco para achar. Aí seguiu o destino normal. [...] A preocupação foi aquela velha briga. Foi o negócio de enterrar. Eles enterram o cara, tiraram o cara do lugar que estava enterrado que era no Alto da Boa Vista porque ia passar na beira de um estrada. Aí, tiraram o cara e levaram para o Recreio [dos Bandeirantes] e enterraram na areia. Só que a Polícia do Exército (PE) quase toda viu isso. [...] Pode ser que tenha ido para o mar. Pode ser que tenha ido para um rio."

Quatro dias depois Malhães prestou depoimento à CNV e "disse que teria recebido a missão de ocultar o corpo de Rubens Paiva, mas que não a teria realizado por ter sido incumbido de outra tarefa". No dia 24 de abril, um mês depois, Malhães foi assassinado. Sua esposa, Cristina Malhães deu entrevista ao jornal O Dia em 6 de maio de 2014 e disse que o coronel teria mentido à CNV.

"A história do Rubens Paiva era a única que eu sabia. Ele falava recentemente e era um desabafar constante. Quando ele contou no depoimento [à CNV] aquela versão, eu estranhei. Só se fosse uma parte que eu não sabia porque ele já tinha me falado sobre isso antes. Ele não podia negar para mim. E o destino final do corpo foi um rio", contou.

*Atualizada às 10h36 do dia 31/03/2016 para acréscimo de informações da Comissão Nacional da Verdade.

Edição: Edgard Matsuki / Leyberson Pedrosa

Creative Commons - CC BY 3.0

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