Compartilhar:
Sem-teto temem violência policial na desocupação de prédio invadido no Flamengo
Criado em 13/04/15 20h51
Por Vladimir Platonow - Repórter da Agência Brasil
Edição:Jorge Wamburg
Fonte:Agência Brasil
Na véspera da possível desocupação do edifício Hilton Santos, no Aterro do Flamengo, com vista para o Pão de Açúcar, o medo era facilmente percebido entre os cerca de 300 sem-teto que ocupam imóvel desde o dia 7 de abril. Formado em grande parte por mulheres, idosos e crianças, o grupo conta as horas para a ação da Polícia Militar, que deverá garantir a reintegração de posse determinada pelo juiz Leonardo Alves Barroso, da 36ª Vara Cível, e que deverá ser cumprida na manhã desta terça-feira (14).
"O medo é a polícia entrar e querer bater, nos machucar. Têm muitas crianças, muitos idosos, pessoas deficientes. Vai ficar difícil. Moro eu e meus quatro filhos aqui", desabafou a ex-gari Verônica Francisca de Castro, que, depois de perder o emprego, passou a viver de faxinas e venda de produtos nos sinais de trânsito.
O imóvel foi arrendado do Clube de Regatas Flamengo pelo grupo EBX, do empresário Eike Batista, e deveria ter se transformado em um hotel, que ficaria pronto até as Olimpíadas. Mas com a derrocada econômica do grupo de Eike, o prédio ficou abandonado, até ser ocupada pelos sem-teto.
"Tá todo mundo com medo, porque da mesma forma que eles podem chegar aqui bem e conversar com a gente, eles também podem chegar já agredindo, como fizeram em outros lugares. Podem chegar batendo. Tem muita crianças e mulheres grávidas", advertiu Adão Júnior, uma das lideranças do grupo. Ele criticou os casos de corrupção noticiados pela mídia e disse que os valores roubados poderiam financiar casas para uma grande parte dos sem-teto.
"Esses políticos desviando dinheiro, se fosse botar no papel, dava para fazer casas para todos os que estão aqui e os que estão nas ruas em outras ocupações", disse Júnior, que é reciclador de materiais e mora há muitos anos nas ruas.
Parte do grupo estava em outra ocupação, num prédio da Companhia Estadual de Água e Esgoto (Cedae), que foi reintegrado em março passado. Alguns vêm de outras ocupações, como a da antiga sede do grupo Oi/Telerj, na zona norte do Rio, que foi desocupada com muita violência, em abril do ano passado.
A disposição dos ocupantes é não resistir à reintegração de posse, que deverá contar com um grande número de policiais, para garantir a segurança dos oficiais de Justiça.
"Temos muito medo deles entrarem aqui. Mas não vamos resistir. Se não, eles vão nos massacrar. Não temos armas para eles. Nossa arma é só a palavra. Se nós sairmos daqui, vamos novamente para a rua. Vamos para a Cinelândia. Lá vamos ficar no relento, aqui pelo menos temos um teto", disse a ex-costureira Célia Regina Cezáreo.
Ela morava em um pequeno imóvel em uma favela, mas foi obrigada a sair por causa do aumento do aluguel: "Eu ganho um salário mínimo. O aluguel aumentou para R$ 350. Entreguei o kitinete onde morava e fiz um barraquinho lá na Cedae".
Procurada para se pronunciar sobre o temor de violência policial durante o processo de desocupação, a PM respondeu, em nota, que "o 1º Comando de Policiamento de Área (CPA) já concluiu o planejamento da ação, mas por questões estratégicas as informações não estão sendo divulgadas".
A Defensoria Pública do Rio de Janeiro também divulgou nota, no início da noite, dizendo que espera reverter, ainda na madrugada desta terça-feira (14), a decisão judicial que determina a saída das famílias que ocupam o prédio.
"Pelo menos 300 pessoas ocupam o prédio, dentre elas 63 crianças, de acordo com informações dos ocupantes. Em mutirão realizado no local na tarde de hoje (13), defensores constataram a presença de pelo menos três bebês e de 15 a 20 crianças menores de 10 anos. Para garantir a integridade física dos ocupantes, os defensores informam que vão acompanhar in loco uma eventual desocupação", informou a defensoria na nota.
A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social esclareceu que as pessoas que ocupavam o prédio da Cedae preencheram uma ficha cadastral, sendo orientadas a comparecer ao Centro de Referência da Assistência Social (Cras) Dodô da Portela, no Santo Cristo, para a inscrição no Cadastro Único. Das 128 pessoas que preencheram a ficha, 24 compareceram ao Cras, segundo a secretaria.
"Também foram oferecidos abrigos, capacitação para o mercado de trabalho e emprego. Apenas doze pessoas disseram que não tinham para onde ir e foram encaminhadas para Unidades de Reinserção Social do município. Os dados repassados no Cras estão sendo verificados e, se as pessoas estiverem no perfil, serão inscritas no Bolsa Família e Cartão Família Carioca", esclareceu a secretaria.
Editor Jorge WamburgDeixe seu comentário