Jovens pedem mais participação e representatividade em reunião aberta da Câmara Infantojuvenil

Publicado em 28/06/2013 - 17:47
“Uma demanda dos nossos adolescentes é, nessa sociedade adultocêntrica, sair desse lugar de 'falar para' e vir 'falar com'”. A fala de Lilian Romão, diretora da Viração Educomunicação de São Paulo, refletiu as opiniões dos participantes da reunião aberta realizada pela Câmara Infantojuvenil do Conselho Curador, no último dia 26.

Estavam presentes no evento, além dos conselheiros integrantes do GT e outros membros do colegiado, jovens, funcionários da EBC, diretores da Empresa e três representantes de entidades ligadas à juventude que fizeram uma fala inicial: Suzana Varjão, Alex Pamplona e Lilian.

A proposta do encontro era colher sugestões e avaliações da programação. “Nas discussões para avaliação do Plano de Trabalho da EBC para o ano de 2013 ficou claro um aspecto: a programação juvenil da TV Brasil deve mudar, para ser mais brasileira, inclusiva, educativa, cultural. Mas de que forma? Com essa pergunta, a Câmara concluiu, em sua última reunião, que era necessário abrir o diálogo e ouvir seu público-alvo”, explicou Ima Vieira, conselheira que presidiu a atividade.

Mas a fala dos presentes foi além de uma análise dos programas que estão no ar, discutindo diretrizes para a formulação de uma política editorial voltada para esse público. “Devemos, antes de falar de programação, falar de política editorial, política de comunicação. Fiquei feliz por perceber que é por esse caminho que estamos indo neste debate”, afirmou Suzana Varjão, que é coordenadora do Núcleo de Qualificação e Relações Acadêmicas da ANDI.

Lilian e Suzana concordaram que, mais do que fazer uma programação para jovens, a EBC deve buscar construir um diálogo com os jovens, permitindo que essa parcela da sociedade possa ser não só representada nos meios públicos, mas que possa direcioná-los também. “Isso passa pela estruturação de instâncias onde os adolescentes não estarão ilustrando uma produção de adultos, mas determinando o que os adultos devem produzir”, explicou a coordenadora da ANDI.

Para Lilian, o mais importante é que esse diálogo com a juventude não seja pontual, mas permanente. “Não é só uma conversa que deve nortear tudo, não vamos e não devemos esgotar o diálogo aqui. Educomunicação é o viés que devemos seguir”, defendeu.

Alex Pamplona, representante da Rede Nacional de Adolescentes e Jovens Comunicadores (Renajoc), de Belém, e também coordenador da Comissão de Comunicação do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), acredita que os movimentos de jovens pelo Brasil, que acontecem  desde o último mês, são um reflexo da falta de participação, desse diálogo constante com a juventude. “Os veículos de comunicação precisam ser esse espaço de participação, um espaço que leve em consideração as demandas da sociedade”.

Rita Freire, conselheira e jornalista, acredita que as manifestações nas ruas estão mesmo ligadas ao desejo de participação direta nas decisões políticas. “Precisamos arejar a contribuição dessa juventude que quer participação direta. Não só para cobertura desse momento, mas em todo tempo”, complementou.

Quebrando estereótipos
O debate abordou, ainda, o tipo de imagem que se tem construído dos jovens nos meios de comunicação. Suzana Varjão afirmou que toda a mídia deve ter atenção especial aos direitos da infância, mas o sistema público de comunicação ainda mais. “A missão do Estado é dar prioridade aos setores mais vulneráveis. Adolescentes e jovens já são vulneráveis, mas existem alguns que são mais ainda, por exemplo, aqueles em conflito com a lei. Nesse sentido, o sistema público deve chegar aonde ninguém quer chegar e falar o que ninguém falar”, defendeu.

Para Alex, os jovens são comumente tratados pela mídia privada como um problema social e é obrigação da comunicação pública reverter essa construção. “Os veículos de comunicação tradicionais repassam pra o público infantojuvenil a responsabilidade de tudo que acontece de ruim no país. Se formos para as favelas dos grandes centros, veremos que a atuação positiva de jovens é infinitamente maior que a negativa, mas isso não é noticiado”, concordou.

Lilian Romão também enfatizou a importância de se desconstruir estereótipos. “A representação de jovens hoje é muito voltada para temas da sexualidade, ídolos da mídia... Mas adolescência não é só isso”, protestou. Para a educomunicadora, a forma de se falar sobre adolescentes e para eles deve mudar não só nos programas especificamente juvenis, mas em todos os conteúdos. Suzana concordou: “não podemos fazer só entretenimento para jovens, mas jornalismo, publicidade, além de pensar formatos e meios.”

Traçar um perfil do público que está acessando a EBC pela internet, identificar o quanto desse público corresponde a jovens e abrir mais espaços para que eles tenham acesso ao conteúdo é uma das receitas para conquistar essa mudança, segundo Lilian. “As conquistas que a EBC tem alcançado na internet são o principal avanço da Empresa na sua relação com o público jovem” disse.

Eduardo Castro, Diretor-Geral da EBC, concordou e destacou a importância que os veículos públicos têm destinado à internet. “Temos considerado a web uma janela aberta, não só para veicular nossos conteúdos, mas para receber. E receber não só material para o jornalismo cidadão, mas para discutir mesmo”, falou.

Deles para eles
Em todas as falas de adolescentes que fizeram contribuições na reunião, um ponto foi sempre abordado: a participação ativa dos jovens na produção dos conteúdos voltados para eles. Enderson Araújo, participante da Renajoc, perguntou à diretoria da EBC se haverá espaço para os jovens serem, além de sugestionadores, atores e apresentadores dos programas. “Quando você coloca um jovem para apresentar um programa, você chama a juventude, cria uma identidade. Colocar o jovem pra falar pra outro jovem: acho que a TV Brasil deveria ter essa preocupação”, sugeriu.

Rayane Soares, produtora da TV Expressão, projeto da Central Única das Favelas (Cufa), reforçou a importância do jovem produzir para o jovem. “Na nossa TV nós fazemos tudo, da produção à apresentação”, contou. Sua colega, Thaís Moreira, lembrou ainda que muitos outros projetos pelo país funcionam da mesma forma. “Aqui só temos três representantes de meios de comunicação feitos por jovens, mas existem muitos outros. Seria importante que vocês procurassem outras entidades que trabalhem com isso para ajudá-los a pensar como implementar e trazer isso pra EBC”.

Lilian explicou que trazer conteúdos feitos por jovens para a grade dos veículos da EBC é totalmente possível, porque eles já estão sendo produzidos por muitos coletivos de comunicação. “É preciso somente identificar produtores jovens, fazer editais específicos, conversar com organizações que já estão estabelecidas”, disse.

Nesse sentido, o Presidente da EBC, Nelson Breve, propôs a organização de um encontro, ainda em 2013, com entidades que produzem conteúdo por jovens e para o público juvenil. “Estamos precisando dessa oxigenação aqui, para não corrermos o risco de pensar o novo com base no velho. Por isso, faço uma proposta de organizarmos um encontro para discutir com jovens que trabalham com educomunicação. Não só sobre a programação da EBC, mas sobre o que eles gostariam de ver”, prometeu.

Na visão do conselheiro Takashi Tome iniciativas como essa, que envolvem os jovens nas programações da Empresa, são positivas porque são uma mudança na mentalidade paternalista que a sociedade tem dos jovens. “Eles sabem muito bem o que eles precisam ver e ouvir”, defendeu. A coordenadora da Viração concorda. Para Lilian, “o jovem não quer ser o centro da  peça, ele quer ser participante. Ele quer conversar tete a tete com o adulto, com o idoso, com a criança. Não é que ele queira estar no centro, só não quer estar à margem”. Ela acredita que uma das diversidades que a TV pública deve garantir é a diversidade etária: “fala-se muito de diversidade racial, religiosa, mas incluir o jovem é trazer diversidade para a programações”.

Como ouvir a juventude
O modelo ideal de como escutar a juventude e trazê-la para perto do Conselho Curador e da EBC não foi questão fechada nas discussões. A conselheira Ima Vieira compartilhou a ideia, surgida anteriormente em reuniões da Câmara Infantojuvenil, de se criar um “Conselhinho Curador”, composto apenas por crianças, que auxiliasse o GT.

“Eu não sei se a ideia de um Conselhinho é o melhor caminho, seria muito difícil garantir diversidade, porque viabilizar a participação de crianças de várias infâncias é difícil. Eu apostaria mais em um espaço lúdico no site onde as crianças expressassem suas opiniões brincando”, defendeu Inês Vitorino, pesquisadora e escritora do livro “Qualidade na programação infantil da TV Brasil” (saiba mais sobre o livro aqui).

A conselheira Rita Freire concordou com ela e sugeriu a realização de encontros regionais para conversar com jovens e crianças. “Não sei se institucionalizar essas conversas é o melhor caminho, precisa ser um debate mais amplo e inclusivo”. Para Suzana Varjão, o modelo de escuta não é tão importante quanto seguir uma metodologia: o cuidado para se evitar absolutismos.

A Câmara se reunirá novamente e, com as contribuições da reunião e demais conhecimentos adquiridos, produzirá um documento de orientação e diretrizes para a programação juvenil das emissoras da EBC, além de deliberar sobre o melhor formato para a atuação do Conselho em relação à juventude e aos temas de seu interesse.

Veja fotos da reunião aqui (as fotos foram produzidas por uma das jovens participantes do evento, Thaís Moreira).

Confira aqui a nota taquigráfica da reunião.

Texto: Priscila Crispi (jornalista da Secretaria Executiva do Conselho Curador)

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