Sem contextualização, bate-boca não rende como notícia

Publicado em 18/11/2016 - 09:27 e atualizado em 18/11/2016 - 11:25

Por Ouvidoria Editor Gecom

Coluna da Ouvidoria

Joseti Marques - Ouvidora da EBC

Lewandowsky e Gilmar Mendes

Para o jornalismo que se pretende diferenciado por ser praticado em veículo do sistema público de comunicação, bate-boca, por si só, não é notícia.  Mas não foi esse o entendimento da Agência Brasil, na matéria publicada nesta quarta-feira (16/11), cujo título já demonstra o que a edição considerou mais relevante no assunto: “Gilmar Mendes e Lewandowski batem boca durante sessão do Supremo”.

Nos dois primeiros parágrafos da reportagem, o leitor mal recebe um resumo do que teria motivado o conflito entre os dois magistrados, para logo ser informado do “bate-boca”, através da transcrição de trechos das falas dos ministros.  No entanto, o tema candente que gerou a polêmica, desprezado pela Agência, este sim era de interesse público: discutia-se, naquela sessão, o processo de uma servidora que pede a restituição dos descontos relativos à contribuição previdenciária sobre os recursos que não foram incorporados aos seus proventos de aposentadoria.

Trocando em miúdos: trata-se de julgar a constitucionalidade da incidência da contribuição previdenciária sobre parcelas adicionais da remuneração, como terço de férias, horas extras, adicional noturno e adicional de insalubridade, percebidas por servidores públicos na ativa, mas que não são incluídas no cálculo do valor da aposentadoria. 

O relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, defendeu a tese de que não deve incidir contribuição previdenciária sobre verba que não seja incorporada aos proventos do servidor ao se aposentar. O ministro Gilmar Mendes foi contra. Em seu voto, no início da sessão, entendeu que a Constituição autoriza a cobrança. O ministro Lewandowski acompanhou a tese do relator. O placar, nessa votação, contava já seis dos 11 votos dando provimento parcial à ação movida pela servidora.

O ministro Gilmar Mendes pede, então, vista do processo, sendo contestado pelo ministro Lewandowski, sob o argumento de que ele, Mendes, já teria proferido seu voto. A presidente do Supremo, ministra Carmem Lúcia, informa que enquanto o julgamento não for concluído os magistrados podem pedir vista. Portanto, nem o pedido de vista, em si mesmo, traz nada de excepcional para que renda uma pauta ou tenha valor de notícia. 

Mas o assunto em julgamento, parte fundamental da contextualização do bate-boca – e obviamente da notícia – tem grande relevância e interesse público.  A decisão do STF sobre o recurso extraordinário da servidora pública terá impacto em pelo menos 30.403 processos em outras instâncias, abrindo a jurisprudência para outros que vierem a reclamar o mesmo direito.

O pedido de vista de Gilmar Mendes pode empurrar a decisão final para as calendas, porque não há prazo para a conclusão do julgamento.  Para a reportagem da Agência Brasil, no entanto, resta ainda o que lhe é de direito e de dever: acompanhar o assunto e oferecer ao leitor uma boa matéria sobre o andamento do processo, esclarecendo sobre a visão antagônica dos magistrados e explicar o que, na prática, a decisão do STF vai significar para os servidores públicos de todas as esferas da Federação que se aposentaram nas mesmas condições da servidora que reclama o que entende como seu direito.

Colocado em primeiro plano, o bate-boca não passa de espetáculo; não chega a ser notícia.

Até a próxima!


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