Oficina do FISL incentiva mulheres a aprenderem programação para web

Imagem: Divulgação/FISL

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Coisa de mulher? Conheça histórias que mostram a pluralidade feminina

Criado em 08/03/16 12h52 e atualizado em 07/07/16 14h52
Por Luanda Lima Edição:Ana Elisa Santana Fonte:Portal EBC

Delicadas, sensíveis, vaidosas, passionais. Muitas mulheres fazem jus a essas e outras características consideradas intrinsecamente ligadas à natureza feminina. Mas... e quem não se encaixa nesses estereótipos?

“Não existe ‘a mulher’, existem mulheres diferentes. Existem mulheres negras, mulheres pobres, mulheres indígenas, mulheres trans”, diz a historiadora Cristina Scheibe Wolff, editora da revista Estudos Feministas [2]. “Esses movimentos refletem essa diversidade e as especificidades da luta cotidiana de todas essas mulheres”, completa, dizendo ainda que “uma série de questões políticas e até ameaças aos direitos das mulheres fizeram despertar, especialmente nas jovens, novamente essa discussão”.

Cristina Scheibe Wolff

Para a professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), existe uma nova geração de feministas, mas suas reivindicações, em grande parte, são antigas. “As grandes questões que estão colocadas para esta geração são as mesmas que são objetos das lutas das mulheres há muito tempo: a decisão sobre o próprio corpo, a igualdade, a luta contra a violência”.

Navegue pelas histórias:

Mulheres que lutam pelo empoderamento | Mulheres que compartilham o desafio da maternidade | Mulheres indígenas | Mulheres que empreendem | Mulheres nerds | Mulheres na tecnologia |  Mulheres que fazem justiça Mulheres trans | Mulheres da periferia Mulheres que quebram o padrão

Em 2014, a artista Raquel Vitorelo iniciou uma série de ilustrações batizada de "Coisa de Mulher", na qual relembra personagens reais que se tornaram referências em áreas geralmente não associadas ao feminino, como esporte e ciência.

Série de ilustrações com retratos de mulheres históricas e suas conquistas incríveis.

Publicado por rvitorelo [3] em Quinta, 7 de agosto de 2014 [4]

 

Neste 8 de março, o Portal EBC traz outros exemplos de quem decidiu viver livremente suas possibilidades e celebra hoje o Dia Internacional da Mulher. De todas elas.

Desconstruir tabus é #CoisaDeMulher

Nana Queiroz
“Uma mulher que é estuprada ainda precisa ouvir que a culpa foi dela”, lamenta a jornalista Nana Queiroz (João Fellet/Reprodução)

“Quando você quer combater e transformar qualquer realidade, o primeiro passo é quebrar o silêncio”, defende Nana Queiroz, criadora da campanha #EuNãoMereçoSerEstuprada, lançada nas redes sociais há quase dois anos. “Uma mulher que é estuprada ainda precisa ouvir que a culpa foi dela”, lamenta a jornalista, que acredita que o aborto precisa ser debatido com urgência no país, para evitar mais mortes provocadas por abortos ilegais, principalmente entre mulheres pobres.

Nana Queiroz

Nana lançou, no ano passado, o livro "Presos que Menstruam", sobre a realidade das mulheres que cumprem pena nas penitenciarias brasileiras. Segundo a autora, sua maior alegria foi ver as campanhas criadas para arrecadar absorventes para as detentas ou ajudar os bebês que vivem com elas. Depois de ganhar um edital para transformar o livro em filme, a ideia agora é fazer uma série.

Também em 2015, a jornalista lançou a Revista AzMina [5], que “não é sobre feminismo, é uma revista feminina”. Neste 8 de março, a publicação faz uma campanha pedindo “presentes verdadeiros de Dia da Mulher”, convidando o público a doar às  bolsas de reportagem [6] da revista o dinheiro que seria usado para comprar uma rosa.

“A gente tem que começar a entender que o feminismo é uma bandeira de todo mundo”, diz Nana.

Joanna Burigo é uma publicitária que também trabalha para a quebra de esteriótipos. Ela conta que se percebeu feminista no período em que morou em Londres, onde fez mestrado. Já de volta ao Brasil, a catarinense criou a Casa da Mãe Joanna [7]. "Eu sempre pensei na Casa não como um concorrente de outros projetos e coletivos online feministas, mas como o projeto que vai divulgar o que eles estão fazendo". Segundo ela, o objetivo não é só fazer militância, “mas traduzir o pensamento feminista para quem não está familiarizado”.

Equipe da Casa da Mãe Joanna
Na imagem, a equipe da Casa da Mãe Joanna. “Se eu pudesse falar do papel do homem no feminismo, ele é de aliado", diz Joanna Burigo, no centro da foto (Divulgação)

 

Joanna Burigo, da Casa da Mãe Joanna

A Casa da Mãe Joanna também oferece cursos e criou a Espiral, um mapa de iniciativas feministas no Brasil construído colaborativamente. E se engana quem pensa que a equipe responsável pelo site é formada apenas por mulheres. “Se eu pudesse falar do papel do homem no feminismo, ele é de aliado, e não protagonista. Eles podem trabalhar com a gente ou, melhor, usar o espaço que têm para falar com outros homens sobre o feminismo”.

Assumir o lado B de ser mãe é #CoisaDeMulher

Teresa Ruas, do projeto Temos que falar sobre isso
Para Teresa Ruas, "a ciência esquece de valorizar o afeto" (Ricson Onodera/Reprodução)

Terapeuta ocupacional, Teresa Ruas se especializou em desenvolvimento infantil e crianças prematuras. Sua formação, no entanto, não tornou menos dolorosa a experiência de viver uma gravidez de alto risco e ver sua primeira filha nascer com apenas 23 semanas de gestação, pesando menos de um quilo. "A ciência esquece de valorizar o afeto e a subjetividade como recursos terapêuticos e isso foi o que eu mais senti no meu momento de UTI". Três anos depois, ela está grávida novamente e lida mais uma vez com uma gestação delicada.

Teresa Ruas, do projeto Temos que falar sobre isso

As dificuldades e o sentimento de desamparo que enfrentou logo após o parto resultaram no seu interesse em participar do Temos que Falar Sobre Isso [8], espaço criado pela amiga Thais Cimino onde mulheres podem desabafar de forma anônima sobre as angústias da maternidade. O projeto conta ainda com a colaboração de psicólogas, todas voluntárias, que orientam as mães.

Depressão pós-parto, instabilidades no puerpério e violência obstétrica são alguns dos temas levantados de maneira recorrente pelas internautas e tratados, muitas vezes, com preconceito e incompreensão. A própria mulher, explica Teresa, costuma se sentir culpada ao ter experiências que fogem das expectativas criadas em torno do que é ser mãe. "Ainda na nossa sociedade existe um romantismo de que a gente precisa ser feliz o tempo inteiro. A maternidade não é um mundo cor-de-rosa”, diz.

Celebrar a herança indígena é #CoisaDeMulher

Potyra Tê Tupinambá
Em muitas comunidades, “as mulheres são as que mais trabalham e as que têm mais responsabilidade no sustento da família”, diz Potyra Tê Tupinambá (Reprodução/Facebook)

“A questão da violência existe nas nossas aldeias. As mulheres estão muitas vezes invisíveis, mas buscando espaço”, diz Potyra Tê Tupinambá. A advogada vive em Ilhéus (BA), integra a ONG Thydêwá [9] e é parte também da Rede pelas Mulheres Indígenas [10].

“Nas comunidades em que trabalho, muitas mulheres já conhecem seus direitos e os homens também já conhecem os direitos das mulheres”, conta.

Potyra Tê Tupinambá

Segundo Potyra, o mercado de trabalho e um atendimento mais especializado no sistema de saúde estão entre suas principais demandas. Em muitas comunidades, “as mulheres são as que mais trabalham e as que têm mais responsabilidade no sustento da família”.

No Nordeste, as jovens têm conseguido, na maioria, conciliar os estudos com a vida na aldeia, diz. “A questão do território é que define mais isso. Nas comunidades que têm terra demarcada, os indígenas não querem sair do seu lar, do seu lugar no mundo”. Para Potyra, a aproximação com novas tecnologias pode ser encarada como uma forma de resistência. “A gente aprendeu a viver com a cultura do não-índio, então consegue separar as coisas e usa a tecnologia a nosso favor”. Ela destaca também o papel feminino nessas comunidades. “As mulheres são as grandes repassadoras da nossa cultura. Elas ensinam aos filhos nossas músicas, nossa forma de viver e ver o mundo”.

Fazer bonito nos negócios é #CoisaDeMulher

Deb Xavier, do projeto Jogo de Damas
“As pessoas achavam que, por ser mulher, não era capaz de lidar com um negócio", conta Deb Xavier, do projeto Jogo de Damas (Reprodução/Instagram)
 

Deb Xavier se deu conta do peso da diferença entre os gêneros quando ficou grávida aos 15 anos, época em que estudava em um colégio militar. “Ali eu vi como eram diferentes as questões para homens e mulheres, porque o pai da minha filha também estudava lá e a repercussão foi bem diferente”. Aos 29 anos, a estudante de Relações Internacionais é referência no exterior. Em 2014 e 2015, Déborah foi escolhida embaixadora brasileira para o Dia do Empreendedorismo Feminino, iniciativa da Fundação das Nações Unidas.

Deb Xavier, do projeto Jogo de Damas

Após voltar de um período aprendendo inglês e trabalhando como garçonete em Nova Iorque, a jovem recebeu a oferta de trabalhar na empresa de tecnologia de um amigo. “Eu trabalhava entendendo as necessidades dos clientes e traduzindo isso para os desenvolvedores”.

Ela abriu sua primeira empresa depois disso, aos 26 anos. “As pessoas achavam que, por ser mulher, não era capaz de lidar com um negócio. Nos eventos, era só homem. Depois de um tempo, reuni um grupo de mulheres para discutir negócios e resolvi criar o Jogo de Damas [11]”. No ar desde em 2012, a plataforma hoje divulga conteúdos para empreendedoras, realiza consultoria, workshops, palestras e treinamentos voltados para o empreendedorismo feminino.

Apesar do estímulo aos negócios capitaneados por mulheres, Deb vê de forma crítica a euforia na área. “Olho com preocupação esse grande aumento de empreendedorismo feminino porque é um sintoma do mercado de trabalho que não está sabendo absorver essa mão de obra. As empresas que não estão dando espaço para as mulheres não estão as perdendo para outras empresas. As mulheres estão criando concorrentes”.

Ana Fontes, da Rede Mulher Empreendedora
Para Ana Fontes, da Rede Mulher Empreendedora, “a gente não tem um ambiente no Brasil que favorece a empreender" (Divulgação)

A dificuldade em conciliar as exigências da carreira com os demais campos da vida foi o impulso para Ana Fontes decidir deixar o cargo de executiva em uma grande empresa. Em 2008, a comunicadora abriu um site de elogios na internet. No ano seguinte, participou de um programa de mulheres empreendedoras e, ali, chamou sua atenção a quantidade de mulheres na mesma situação que ela: deixando o mundo corporativo, com filhos pequenos e buscando empreender, mas se sentindo sem apoio. Foi aí que surgiu a Rede Mulher Empreendedora [12], que nasceu como um blog para falar sobre as dificuldade de ser mãe e ter um pequeno negócio.

Ana Fontes, da Rede Mulher Empreendedora

Um grupo criado no Facebook para trocar dicas deu origem a encontros entre as participantes, que foram levando novas interessadas. “Hoje temos 250 mil mulheres na rede no Brasil inteiro”. Assim como Deb, Ana vê na falta de flexibilidade pelas empresas o fator primordial para mulheres que decidem empreender. Ana comenta ainda o movimento crescente de mulheres na faixa dos 50 anos na fase do ninho vazio - quando os filhos saem de casa e elas se veem sozinhas - e não são mais aceitas pelo mundo corporativo. Outro número que vem aumentando, segundo ela, é de meninas que veem no emprendedorismo uma opção de carreira. Os obstáculos, porém, não são poucos. “A gente não tem um ambiente no Brasil que favoreça a empreender. O ambiente é muito instável, não temos acesso fácil ao crédito, não temos facilidade para abrir um negócio nem para contratar gente”.

Para quem quer abrir seu negócio, Ana Fontes dá as dicas:

1) Participe de eventos de empreendedorismo e conheça outros empreendedores, antes mesmo de abrir sua empresa;
2) Eleja uma pessoa da sua rede de relacionamentos ou que lhe inspire para ser seu mentor: alguém que dê orientação e força;
3) Procure alguma coisa que as pessoas estejam precisando. “Invista tempo em descobrir qual seria o negócio mais interessante que associe aquilo que você gosta de fazer, mas que também seja uma oportunidade de negócio e as pessoas estejam querendo comprar”.

Ser nerd é #CoisaDeMulher

Gabi Franco, do MinasNerds
"Era impensável uma mulher saber mais de quadrinhos", diz Gabi Franco (segunda à esquerda), do site MinasNerds (Divulgação)

Escrevendo há mais de 15 anos sobre cultura pop, Gabi Franco colaborava com revistas e sites sobre histórias em quadrinhos. Mesmo assim, era alvo de comentários machistas nos grupos de discussão na internet. “Sempre me mandaram lavar roupa, lavar louça, diziam que eu não sabia do que estava falando. Era impensável uma mulher saber mais de quadrinhos do que eles”. A misoginia vem, segundo ela, principalmente de homens na faixa dos 40 anos. “Esse opressor está se sentindo acuado. E é ele que reclama”.

Gabi Franco, do MinasNerds

Como exemplo, ela cita as diferenças no cosplay, atividade de se fantasiar como um personagem e interpretá-lo da forma mais fiel possível. “O cara pode ir sem camisa e de sunguinha que todo mundo respeita. Ninguém chama de ‘puto’ ou diz que ele quer dar. Mas vai uma mulher fazer uma coisa dessas?”.

Em março de 2015, Gabi participava de um fórum de quadrinhos quando foi xingada por um participante. “Aí eu falei ‘vou criar um grupo só de mulher pra mulher falar sobre quadrinhos, sobre RPG, sobre nerdice, porque não é possível que eu seja a única”. Foi assim que surgiu o MinasNerds [13], site que contabiliza 40 mil acessos por dia. Sua equipe marcou presença na Fest Comix 2015, importante feira de quadrinhos no Brasil, levando palestras ao evento.

Para Gabi, a força do público feminino está começando a ser percebida pelo mercado. “A mulher representa hoje 40% de gamers no Brasil, por exemplo”. Nos quadrinhos, as mudanças também já aparecem. Aos poucos, a criação de personagens femininas sexualizadas e superficiais está caindo. “Mulheres ganharam grandes protagonistas nos quadrinhos. Existem editoras que estão apostando grandemente nesse nicho de representatividade”.

Até os uniformes das personagens estão sendo reformulados. “Não é que não possa existir heroína de collant. Pode, mas não só isso”, argumenta. “Uma grande quebra de paradigmas que teve agora foi o uniforme da Red Sonja, parceira do Conan. Ela usava um biquíni de malha. Hoje ela usa uma armadura, porque ela é uma guerreira”. No último filme da saga Star Wars - O Despertar da Força, lançado no fim de 2015, “a Rey não mostra nenhum pedaço do corpo e foi uma baita protagonista. Por que tem que ter uma história de amor e apelo sexual? Acho que eles aprenderam bastante depois da Leia escrava”, brinca, em referência à personagem da atriz Carrie Fisher.

Mandar bem na tecnologia é #CoisaDeMulher

Bárbara Paes, do projeto Minas Programam
“Para estar envolvido com tecnologia, não é um pré-requisito ser homem”, defende Bárbara Paes, do projeto Minas Programam (Reprodução/Instagram)

Os questionamentos de duas estudantes de Relações Internacionais de São Paulo sobre a hegemonia masculina nas discussões sobre internet levou Bárbara Paes e Fernanda Balbino a se unirem à designer Ariane Cor, mesmo sem profundo conhecimento na área. Inspirado por iniciativas estrangeiras como Black Girls Code e Girls who Code, o trio criou então o Minas Programam [14], que ofereceu um curso básico para cerca de 30 meninas no fim do ano passado.

Bárbara Paes, do projeto Minas Programam

“Pra estar envolvido com tecnologia, não é um pré-requisito ser homem”, diz Bárbara. O caminho das interessadas não é fácil, no entanto. “É um ambiente muito hostil. A gente conhece o relato de várias mulheres que trabalham com tecnologia de como o intelecto delas era menosprezado ao longo do processo de aprendizado por meio de piadinhas e assédio”.

“Além de muito masculina, a tecnologia da informação também é muito branca, o que é outro impeditivo”, lamena Bárbara. Somado a isso, os preços dos cursos tradicionais muitas vezes são elevados, conta. Por isso, a equipe buscou selecionar jovens com poucos recursos. “A gente tentou captar meninas que moram na periferia, dependem dos pais, não têm grana ou que têm filhos”. Segundo Bárbara, depois das aulas, muitas meninas começaram a pensar em atuar em áreas ligadas à tecnologia.

“A programação está na forma como a gente pensa todas as soluções da nossa sociedade. Enquanto metade da população não estiver incluída nesses processos, a gente vai criar modelos falhos”. A falta de estímulo começa cedo na vida das meninas, acredita Bárbara. “Não é esperado que elas gostem de Matemática ou Ciências e isso acaba se concretizando”.

Por isso, a estudante sugere que o incentivo a atividades como cursos de robótica, olimpíadas de Matemática, Astronomia e Física. “As meninas que programam não programam melhor porque são mais delicadas ou têm um olhar mágico. Elas programam tão bem quanto e a vivência é diferente, então as soluções são diferentes”.

Defender mulher do machismo é #CoisaDeMulher

Gisele Truzzi, advogada especialista em Direito digital
Sobre casos de revenge porn, a advogada Gisele Truzzi diz que “a sociedade culpa muito a mulher nesse tipo de crime e ela assume essa culpa para si" (Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

“Caiu na rede”. Com essas palavras, centenas de brasileiras têm, a cada ano, sua intimidade devastada em sites de conteúdo adulto e redes sociais. São fotos e vídeos de nudez e sexo divulgados sem consentimento, em sua maioria, e compartilhados milhares de vezes, desconsiderando o impacto sobre a vida dessas mulheres. Com frequência, elas são recriminadas, perdem o emprego, entram em depressão e, humilhadas, se isolam.

Gisele Truzzi, advogada especialista em Direito digital

“A sociedade culpa muito a mulher nesse tipo de crime e ela assume essa culpa para si. Não se veja como culpada: você é vítima”, diz a advogada Gisele Truzzi, especialista em Direito digital. Segundo a profissional, a maioria das mulheres que buscam sua ajuda é vítima do chamado revenge porn, ou pornografia de vingança, quando materiais íntimos são publicados por ex-namorados, ex-maridos ou ex-amantes, por exemplo. O apoio das pessoas próximas, nesse momento, é fundamental.

Gisele aconselha as vítimas a:

1) Reunir todas as informações possíveis sobre o crime. “Antes de solicitar a retirada do conteúdo do site, tirar o print, pois essa vai ser sua única prova, assim como o link do site ou perfil”;
2) Registrar boletim de ocorrência. “Se possível, não vá sozinha e procure uma delegacia da mulher”;
3) Buscar a orientação de um advogado, que pode ser da Defensoria Pública;
4) Se o material está circulando em uma rede social, denunciar o conteúdo;
5) Fazer uma denúncia para a Safernet. Dependendo do tipo de violação, acionar também o Ministério Público Federal e a Polícia Federal.

A advogada faz mais um alerta: a pessoa que replica esses materiais também pode ser responsabilizada na Justiça. “Quem compartilha conteúdo difamatório ofensivo publicado por um terceiro incorre na mesma difamação, em menor grau”.

Ser trans é #CoisaDeMulher

Naomi Neri
Na opinião da bióloga Naomi Neri, “o mercado de trabalho para pessoas trans não existe" (Aline Ferreira/Reprodução)
 

No dia 17 de fevereiro, Naomi Neri defendeu seu trabalho de conclusão de curso na Universidade Estadual de Maringá, no Paraná. Primeira transexual a se formar ali, a bióloga se destacou entre os colegas. “Por que uma trans defendendo um TCC sobre transexualidade é um fato a ser noticiado? Porque não existem pessoas trans discutindo o tema”, diz a bióloga, de 23 anos.

“Meu processo é recente. Essa trajetória só foi possível porque houve muito apoio, tanto na universidade quanto no âmbito particular, com meus amigos, minha família, meu namorado”, conta. “A frase que eu coloco de início no meu TCC é que a única coisa que diferencia as pessoas cis das pessoas trans são as oportunidades”. A inspiração foi o discurso da atriz Viola Davis ao receber o Emmy de melhor atriz em 2015, quando falou sobre as barreiras para mulheres negras.

Creative Commons - CC BY 3.0 - Naomi Neri

A formação de professores de Ciências da rede municipal de Maringá foi o foco da jovem em sua monografia. O resultado da pesquisa revelou o despreparo dos educadores para lidar com a diversidade em sala de aula. “Não existe formação sobre transexualidade e muitos dos conceitos transfóbicos se difundem no ambiente escolar”, concluiu. Para Naomi, esse é um dos fatores que levam à evasão desses alunos. “Como você explica a situação de uma pessoa trans quando essa escola não tem acesso a informações sobre como ela deve ser tratada?”, questiona.

Na opinião da estudante, o movimento contrário à inclusão de discussões sobre gênero na educação contribui para a marginalização de homens e mulheres trans na sociedade. “O que seria essa invisibilidade? É tanto você não ver essas pessoas no seu dia-a-dia, na fila do mercado, comprando pão ou no seu trabalho, quanto não ver representações positivas de pessoas trans”.

“O mercado de trabalho para pessoas trans não existe”, diz Naomi. “A pessoa trans que poderia conseguir um emprego é a que não se parece com uma pessoa trans. Existe uma prática de se vestir de personagens, sobretudo japoneses, que se chama cosplay. Então nós falamos que para uma pessoa trans conseguir um emprego, precisa fazer 'um cisplay'”.

“Fora a prostituição, onde você pode ver pessoas trans ocupando espaços é em salões de estética”. Por isso, depois que terminou a faculdade, Naomi começou um curso de cabeleireira no Senac. A instituição não respeita o nome social, relata ela. “Imagina qual não foi a minha surpresa quando, no primeiro dia de aula, se passa uma lista e aparece meu nome de registro. Eu me recusei a assinar”.

Procurado pelo Portal EBC, o Senac Paraná informou em nota que, a partir da solicitação dos alunos, utiliza o nome social "em qualquer atividade ou menção pública/coletiva dentro da instituição. Ressalta-se, porém, que o ordenamento jurídico brasileiro consagra o direito/dever a um nome civil, mas ainda não dispõe sobre a possibilidade/necessidade de um nome social".

Com a repercussão positiva sobre seu caso, a jovem considera a possibilidade de fazer mestrado. “Agora eu vejo de uma forma mais interessante”. A bióloga diz que assumiu sua identidade depois de participar de uma mesa-redonda de mulheres na UEM. “Foi a primeira vez que eu fui à universidade vestida com uma indumentária feminina e desde então eu a tenho usado”, lembra. “Vai ser o meu primeiro Dia da Mulher”, conta Naomi.

“É muito importante que, no dia 8 de março, se comemore todas as mulheres, inclusive as mulheres trans”

Naomi Neri, bióloga, 23 anos
MC Xuxú
“Cresci aprendendo a ser feminista”, diz MC Xuxú (Ana Cláudia Ferreira/Divulgação)

“Um beijo pras travestis”, canta MC Xuxú na música que a lançou no mundo do funk, cujo clipe contabiliza mais de 1,8 milhão de visualizações no YouTube desde 2013. “Quando eu comecei a cantar, aprendi que tinha que falar nas minhas músicas o que eu era e a minha realidade”, conta ela, que deu início à carreira aos 17 anos. “Sinto que aprendi certo no hip hop, fazendo o microfone de arma”.

MC Xuxú

Para Xuxú, a transfobia se manifesta principalmente nos olhares. “As pessoas começam a te olhar de longe, vêm te encarando. Tem gente que olha pra nossa cara e para o meio das nossas pernas, parece que tem que dar uma confirmada. Isso é horrível”, lamenta a moradora de Juiz de Fora (MG).

“Hoje conheço várias travestis MCs. Cada uma tem um propósito e eu vejo que todo mundo vê em mim militância”. Além da música, a cantora usa o humor para falar sobre o universo LGBT com seus seguidores no Facebook.

“As pessoas estão muito carentes de rir hoje em dia. A gente ouve tanta notícia triste. Todo dia é uma travesti que morreu, alguém que foi expulso de casa e eu conto essa realidade também, mas aposto no humor porque ele é uma forma diferente de lutar”

MC Xuxú

“Eu sempre ouvi que travesti era salão ou prostituição, até ver que isso era verdade”. Depois de sair das ruas, Xuxú consegue agora se sustentar com seus shows. “Hoje eu vivo só do meu sonho”. Ela pensa também em alternativas à carreira. “É complicado manter isso. Além de cantora, quero fazer outra coisa legal também”, planeja a MC, que considera o Dia da Mulher importante na sua vida. “Cresci aprendendo a ser feminista”, diz.

Dar voz a quem vive na periferia é #CoisaDeMulher

Lívia Lima, do projeto Nós, Mulheres da Periferia
Lívia Lima, do projeto "Nós, Mulheres da Periferia", critica os estereótipos difundidos na mídia (Reprodução/Facebook)

Ninguém melhor para falar sobre suas experiências do que a pessoa que as vivencia. A missão se torna mais difícil quando os relatos vêm daquelas que são postas à margem da sociedade, com difícil acesso a transporte, moradia, educação, segurança e outros direitos. Trazer esses relatos à tona é o objetivo do projeto Nós, Mulheres da Periferia [15], realizado na capital paulista.

Lívia Lima, do projeto Nós, Mulheres da Periferia

“Alguns estereótipos que a gente via é de que a mulher de periferia é sempre vitimizada e suas histórias são contadas de forma negativa. Em novelas, ela é barraqueira ou piriguete. Não se vê a complexidade que cada uma tem”, diz Lívia Lima.

“Eu não me sentia representada em alguns desses personagens, em algumas dessas histórias”, lembra a jornalista, que sustenta a necessidade de sempre considerar gênero, classe e questão racial ao falar dessas mulheres.

Observando que nem sempre seu público-alvo acessava a internet, as participantes do coletivo pensaram em outras formas de se aproximar. Elas então promoveram oficinas sobre a representação das mulheres de periferia na mídia. A partir das discussões, fizeram telas, fotografias e vídeos que viraram a exposição "Quem Somos (Por Nós)", inaugurada no ano passado. “A gente levou as mulheres à exposição, elas viram o trabalho delas e foi um empoderamento muito grande, tanto pra elas quanto para a gente o reconhecimento de que as mulheres da periferia e suas histórias são importantes”.

Amar o próprio corpo é #CoisaDeMulher

Jéssica Ipólito, do blog Gorda & Sapatão
Copyright - "O preconceito ainda é muito poderoso”, diz Jéssica Ipólito, do blog Gorda & Sapatão (Alile Dara Onawale)

“Gorda, sapatão, negra, filha de mãe preta solteira e pai branco omisso”. É assim que Jéssica Ipólito se descreve no blog Gorda & Sapatão [16], em que escreve sobre questões como racismo, lesbofobia, feminismo e padrões de beleza.

Jéssica Ipólito, do blog Gorda & Sapatão

“Eu não consigo ver em mim nada que seja tão marcante quanto isso. Escolhi usar essas duas palavras justamente para fazer esse contraponto de que não são palavras ruins. São identidades também”. Aos 24 anos, a blogueira vive na capital paulista, mas está de mudança: ela foi aprovada na graduação pioneira em Estudos de Gênero e Diversidade, da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

“Meu cotidiano é muito sobre ser gorda. No ônibus, o tempo todo as pessoas me olham e comentam”, relata. A discriminação racial também é muito presente no seu dia-a-dia. “O racismo das pessoas vem muito mais forte quando eu estou com o black solto”. Jéssica lembra do constrangimento pelo qual passou por causa de uma colega de trabalho. “Eu falei ‘você não pega no cabelo da sua amiga branca e oferece para os outros tocarem. Por que vai fazer no meu?’”. Já a lesbofobia se manifesta, em geral, quando ela está na rua com amigos LGBT.

Em fevereiro, a jovem de São José do Rio Preto viu uma enxurrada de críticas e ataques massivos chegar a suas redes sociais depois de um ensaio feito pelas fotógrafas Alile Dara Onawale e Renata Martins. “As pessoas não concebem a ideia desse corpo que eles julgam marginalizado, que eles excluem, de ser um corpo que se ama”.

“Não tem um dia em que eu não lembre que preciso continuar e que, apesar de tudo, sou bonita”, diz Jéssica Ipólito. “Senão a gente vai acabar sendo derrubada muito fácil. O preconceito ainda é muito poderoso”.

 

Entrevistas: Luanda Lima, Liria Jade e Cibele Tenório

Creative Commons - CC BY 3.0

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