Meninas do Brasil caíram ainda na primeira fase da Copa do Mundo feminina sub-20, com duas derrotas e um empate em um grupo com Alemanha, China e Estados Unidos

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Jogadoras de futebol reagem a críticas e denunciam falta de estrutura e amadorismo

Criado em 15/08/14 16h27 e atualizado em 15/08/14 16h46
Por Nathália Mendes Fonte:Portal EBC

Seleção brasileira feminina sub-20
Meninas do Brasil caíram ainda na primeira fase da Copa do Mundo feminina sub-20, com duas derrotas e um empate em um grupo com Alemanha, China e Estados Unidos (Foto: Rafael Ribeiro / CBF)

Mais de cem jogadoras de futebol feminino assinam um manifesto em que denunciam as precárias condições do esporte profissional entre as mulheres e criticam “as ligações esdrúxulas e comparações completamente equivocadas” entre a derrota da seleção feminina sub-20 por 5 a 1 para a Alemanha, na Copa do Mundo juvenil, e a eliminação vexatória do time principal masculino para os alemães, na última Copa do Mundo. O texto foi divulgado nesta sexta-feira (15) nas redes sociais de algumas atletas, como a goleira Thais Picarte, meia Rosana e a zagueira Andreia.

“Enquanto as nossas condições de trabalho forem semelhantes a das peladas que você joga aos finais de semana, respeite-nos e entenda que estamos fazemos milagre ao competir de igual para igual com as principais seleções do mundo”, pontua o texto. As atletas afirmam que o futebol feminino “está em crise desde a data de seu nascimento” e que não há estrutura que permita dedicação exclusiva ao futebol: “a maioria de nós treina seis dias por semana, estuda, trabalha e ainda é dona de casa (…) Não temos mordomia nem salários astronômicos, no máximo temos acordos verbais e ajudas de custo durante três ou seis meses do ano, período das competições femininas no país”.

Falando sobre a seleção sub-20 de mulheres, as jogadoras lembram que o Brasil não conta com competições de base para completar a formação dessas atletas. Elas concluem dizendo que seguem sonhando com mais clubes e mais jogos, mais investimento e reconhecimento e menos preconceito.

O Bom Senso Futebol Clube, movimento de jogadores do futebol masculino, reagiu ao desabafo das colegas, manifestando apoio à causa das jogadoras. Em um texto intitulado “Terra Devastada” (clique para ler), os atletas consideram “inaceitável” a falta de investimentos da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e federações no futebol feminino: “Seria preferível que o futebol feminino se desvinculasse da desinteressada CBF para que pudesse criar uma confederação independente e recebesse verba da Lei Piva”, sugerem.

Para o Bom Senso, um comando descentralizado da CBF permitiria que o futebol feminino fosse conduzido por atletas e ex-atletas e gestores profissionais, que poderiam traçar um planejamento para fomentar o desenvolvimento da prática entre mulheres.

De acordo com o Bom Senso, o Brasil conta com apenas três mil jogadoras registradas. O Registro Geral de Atletas, disponível no site oficial da CBF, aponta mais de seis mil atletas cadastradas. Na Alemanha, são mais de um milhão de jogadoras, que jogam em um campeonato nacional que cona com duas divisões.      

 

Leia o manifesto das jogadoras de futebol na íntegra:

"NUAS E CRUAS"

Quem nunca sonhou em ser um jogador de futebol?

Em um país machista e preconceituoso que nunca acreditou, aceitou ou investiu de verdade no futebol feminino, é muito difícil para nós sonhar. Que o diga as meninas da Seleção sub-20, derrotadas pela Alemanha por 5 a 1 na última terça-feira, e expostas a uma chuva de criticas e comparações completamente equivocadas, sem nenhum conhecimento sobre a nossa modalidade ou sobre a realidade em que vivemos.

Ficamos chocadas com as manchetes sensacionalistas, as ligações esdrúxulas com a vexatória derrota da Seleção masculina na última Copa do Mundo, e com centenas de baboseiras escritas sobre as jovens atletas que, diga-se de passagem, nem competição sub-20 têm no Brasil para se formarem devidamente como “jogadoras de verdade”.

Esta nota, em comum acordo com mais de 100 atletas do futebol feminino, se faz mais do que necessária e vem em tom de desabafo, não para julgar técnica ou taticamente a partida em questão, nem para competir com o futebol masculino, mas para mostrar que somos de carne e osso, existimos, queremos ser ouvidas, não só nas derrotas e nos vexames, mas nas notícias e no dia-dia. Queremos a exposição dos nossos problemas, assim como dos nossos jogos e campeonatos. Queremos, inclusive, que nos ajudem a cobrar as pessoas e as entidades que têm o papel de zelar pelo nosso esporte e não estão nem aí para ele. Chega!

Não há e nunca houve estrutura que nos permitisse dedicação integral ao futebol. A maioria de nós treina 6 dias por semana, estuda, trabalha e ainda é dona de casa. Somos amadoras e sabemos que não será por meio da “profissão” que, por amor, escolhemos para viver que garantiremos o nosso futuro ou a nossa aposentadoria. Não temos mordomia nem salários astronômicos, no máximo temos acordos verbais e ajudas de custo durante 3 ou 6 meses do ano, período das competições femininas no país.

Vivemos de sonhos.

Aliás, se há alguma coisa em que somos realmente craques é em sonhar. Sonhamos com mais clubes e com mais jogos, sonhamos com o reconhecimento por parte da CBF de que se deve investir no futebol feminino, sonhamos que a nossa luta valerá a pena e que o nosso esforço será capaz de pavimentar a estrada pela qual as nossas crianças e jovens se sentirão bem ao praticarem o futebol feminino nas escolas e nos clubes, sem que recebam um olhar ressabiado ou a falta de incentivo da família.

Se um dia as meninas puderem escolher o futebol como profissão, a nossa dedicação terá valido a pena. Aí sim aceitaremos que nos falem de vergonha, de fracasso, de vexame e de atropelamento. Mas antes disso, enquanto as nossas condições de trabalho forem semelhantes a das peladas que você joga aos finais de semana, respeite-nos e entenda que estamos fazemos milagre ao competir de igual para igual com as principais seleções do mundo, que não param de investir e de se desenvolver.

Não queremos ser isca para nos usarem em meio a atual crise do futebol brasileiro como alguns aproveitadores fizeram com as nossas talentosas meninas da Seleção sub-20. Nós, que vivemos o dia a dia, sabemos que o futebol feminino do Brasil está em crise desde a data do seu nascimento, mas estamos dispostas a mudar essa realidade. Basta nos darem a oportunidade, investirem em nós e acreditarem no nosso talento e no nosso amor pelo esporte. Chega de sonhar, é hora de sentar a mesa com a CBF e fazer acontecer, doa a quem doer.

 

Leia o texto do Bom Senso Futebol Clube:

 
 

 

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