Escola Municipal Amorim Lima, no Butantã, em São Paulo

Imagem: Divulgação/Quero na Escola

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Aula de fotografia, feminismo e surf? Plataforma incentiva protagonismo de alunos de escolas públicas

Criado em 12/12/15 10h11 e atualizado em 23/12/15 19h07
Por Fernanda Duarte Fonte:Portal EBC

E se os adolescentes não fossem alunos desinteressados? E se eles pudessem expressar o que gostariam de ver nas suas escolas? Foi tentando buscar respostas a essas perguntas que a jornalista Cinthia Rodrigues e um grupo de amigas embarcaram em uma “grande aventura” pelo mundo da tecnologia e pelas escolas públicas da capital paulista que resultou no projeto “Quero na Escola [2]”. 

Ao descobrirem que, ao contrário do que parecia, os estudantes tinham sim interesse na escola, mas se sentiam um pouco frustrados quanto à forma com que o processo educativo – burocrático, pouco flexível e sem muitas vezes considerar a opinião e conhecimentos dos próprios alunos – era conduzido, elas resolveram criar uma plataforma que aproximasse escola e comunidade. “Minha ideia desde o início era propor algo voltado para a área de educação pública, mas não sabia exatamente o quê. Então, fui ouvir professores e alunos para saber quais eram as suas necessidades. Foi quando uma garota começou a descrever para nós a escola que ela queria e nessa escola que ela imaginava tinha uma oficina de escrita criativa. Eu pensei: é isso!”, relata Cinthia.

Palestra sobre feminismo do projeto Quero na Escola
Creative Commons - CC BY 3.0 - Palestra sobre feminismo foi um dos pedidos atendidos pelo projeto Quero na Escola

Divulgação/Social Good Brasil

Lançada em agosto, a iniciativa recebe pedidos de palestras, cursos, oficinas, performances, entre outras possibilidades de aprendizado, de estudantes de escolas públicas e cadastra voluntários dispostos a atender tais solicitações. “Até o momento já conseguimos realizar 10 oficinas, alcançando 380 alunos atendidos, mas já recebemos cerca de 150 pedidos de todo o país”, conta. Os pedidos são variados: aula de capoeira, fotografia, quadrinhos, libras, surf, piano e até feminismo.

Outros aprendizados

Téo Ferreira de Oliveira, 18 anos, foi um dos primeiros estudantes a ter o pedido atendido pelo Quero na Escola. Aluno da Escola Técnica Estadual Guaracy Silveira, no bairro de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, ele tinha muita vontade de conhecer mais sobre cerâmica. “Tinha achado a ideia do projeto muito legal e me inscrevi. Quando soube que o meu pedido seria atendido fiquei muito feliz. A oficina foi sensacional!”. 

Na opinião do estudante, iniciativas como a do Quero na Escola, que partem das demandas dos alunos e não do que se quer simplesmente ofertar à escola, possibilitam que os alunos se expressem, interajam e aprendam coisas diferentes uns com os outros e com a comunidade.

“Se a gente quiser qualquer atividade ou conhecimento extracurricular a gente tem que ir atrás. A escola só se preocupa com a preparação para o vestibular, mesmo que alguns conteúdos não façam sentido na sua vida.”

A questão de propiciar outros aprendizados a partir do interesse dos alunos foi o que motivou a jornalista Marcella Chartier a se cadastrar como voluntária da iniciativa. “Eu já tinha trabalhado com educação e achei muito legal a ideia do projeto por focar no protagonismo do aluno”, diz ela que se cadastrou para falar sobre escrita criativa, mas acabou atendendo um pedido para falar de feminismo. “Ver a aluna que fez o pedido e os colegas do grêmio estudantil se mobilizando para organizar uma turma de quase 150 alunos para ouvir a gente falar das questões de gênero na nossa sociedade e depois percebê-las encorajadas para subir ao palco e dividir experiências pessoais de assédio com o grupo foi uma experiência muito válida e que serviu para que o grupo percebesse que poderia organizar outras atividades na escola.”

Currículo e protagonismo juvenil

De acordo com o professor Ismar de Oliveira Soares, do Núcleo de Comunicação e Educação da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), a exemplo do que se pode observar durante a ocupação de escolas estaduais por estudantes paulistas, a escola é uma instituição importante no universo dos jovens, mas há uma disruptura entre a escola de hoje e a escola que os jovens desejam. “O sistema educacional atual se baseia em um conceito de ensino-aprendizagem, em que a apresentação dos conteúdos se dá de forma seriada e onde se supõe a existência de conteúdos essenciais para todos. Essa perspectiva, embora tente ser democrática, pressupõe as necessidades do aluno e não contempla aspectos de interesse local ou dos estudantes. Isso fica fora do âmbito da educação formal. A preocupação é com o que vai cair nas avaliações [como o Exame Nacional do Ensino Médio – Enem] ou no vestibular e espera-se que o 'bom aluno' seja aquele que aceite e seja obediente a essa proposta engessada de ensino”, explica.

Para Soares, que vem se debruçando sobre a questão de como as tecnologias de comunicação e informação podem contribuir para transformar a prática pedagógica e o currículo da educação básica, notadamente do ensino médio, iniciativas como a do Quero na Escola dão ao jovem a oportunidade de estar no centro de um processo educativo. “Esse não é um fenômeno exclusivo do Brasil. Em toda a América Latina há movimentos e organizações que buscam oferecer ao jovem e adolescente aquilo que a escola não lhe dá: o direito de expressão, o empoderamento para o exercício da cidadania. Essas experiências acabam acontecendo por meio dessas entidades que atuam na educação não-formal, em grande parte apoiadas pelo uso do computador, do celular, das redes sociais, porque a escola não as assume, mas esses preceitos estão lá nos parâmetros curriculares do nosso sistema educacional, inclusive com a previsão da participação do aluno na construção de seu currículo” afirma.

O projeto Quero na Escola está fazendo uma campanha de financiamento coletivo para atingir a meta de 10 escolas com páginas próprias e pedidos registrados. Para isso, qualquer pessoa ou empresa pode colaborar com doações até o dia 2 de dezembro. Clique aqui para saber mais [3].

Creative Commons - CC BY 3.0

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