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Manifestação popular e transmissão da TV pública durante queda de Fernando Lugo

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Como caiu o primeiro presidente de centro-esquerda do Paraguai

Criado em 21/11/12 11h17 e atualizado em 21/11/12 12h07
Por Natália Viana Fonte:Agência Pública

 

Fernando Lugo - Paraguai - III
Manifestação popular e transmissão da TV pública durante queda de Fernando Lugo (Rafael Alejandro Urzúa Urzúa/Flickr/Creative Commons)

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Quinta-feira, dia 21 de junho foi, efetivamente, o último dia do governo do primeiro presidente de centro-esquerda a chegar ao poder na história do Paraguai. A Câmara dos Deputados já discutia o juízo político a todo vapor; naquela mesma noite, elaboraria e apresentaria o libelo acusatório, documento de acusação que embasaria a destituição. Com base nele, o Senado votaria como juiz, no dia seguinte.

Naquela manhã, José Tomas Sanchez, ministro da Função Pública, participava de um seminário junto com outros membros do governo. Sanchez, que era o ministro mais novo, não se lembra bem sobre o que falou. Lembra-se apenas que o telefone não parava de vibrar. “Um monte de ligações do ministério. E o telefone de todo mundo vibrava. Renunciou o ministro liberal. ‘Nossa senhora’, eu pensava. Os liberais estavam renunciando, um a um, e a gente vendo aquilo, na mesa do debate, era um desespero”.

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Os principais ministros liberais, como Enzo Cardoso, da Agricultura, e Humberto Blasco, da Justiça e Trabalho, renunciaram por volta das 11 horas.

Na embaixada brasileira, a ficha caía naquela mesma hora. Até então, o corpo diplomático tivera cautela para não acionar a cúpula do Itamaraty, entretida nas negociações da Rio + 20, evento da ONU sobre meio ambiente que acontecia no Rio de Janeiro. “Achávamos que era só mais uma crise”, diz uma fonte do Itamaraty. “O que víamos era que não havia nenhuma relação direta do fato, entre o massacre de Curuguaty e o presidente”. Na quinta-feira de manhã, o alarme foi acionado. “Ao meio-dia eu liguei para a Dilma e o (Pepe) Mujica”, diz Lugo.

Na Rio+20, o chanceler paraguaio Lara Castro pediu uma reunião extraordinária da Unasul ali mesmo, no Rio Centro. “A verdade é que quando eu recebi a notícia, pelo telefone, não foi uma surpresa”, diz. As informações batiam com o tom de urgência repassado pela embaixada brasileira no Paraguai. A reunião foi presidida por Dilma Rousseff e contou com os presidentes José Mujica, do Uruguai, Rafael Correa, do Equador, Evo Morales da Bolívia, Sebastian Piñera do Chile e Juan Manuel Santos, da Colômbia. Naquela mesma noite, uma delegação de chanceleres dos países que compõem a Unasul – Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Chile, Guiana, Suriname e Venezuela – aterrissou em Assunção.

“Eu expliquei a eles que havia elemento de um golpe de Estado”, lembra Lara Castro. “Havia um processo tão acelerado, que seria condenável pela cláusula Ushuaia II”. A chamada “claúsula democrática”, assinada pelos presidentes dos países do Mercosul em dezembro de 2011, estabelece sanções aos países-membros em caso de ruptura democrática, desde a suspensão da organização até suspensão de tráfego aéreo e terrestre e de fornecimento de energia.

Lugo, como os demais presidentes, assinou a cláusula, mas diante da reação do Congresso, jamais o enviou para sanção. “Depois que assinamos a cláusula, a campanha pelo impeachment foi permanente na imprensa. Foi um bombardeio em janeiro e fevereiro, houve uma ameaça constante”, diz Lara Castro. “Os jornais nos chamavam de traidores da pátria, pediam juízo político a Lugo e interpelação a mim”.

cláusula de Ushuaia 2, embora não tenha sido oficialmente sancionada, foi um dos cinco motivos, ao lado da matança de Curuguaty, apontados pela Câmara dos Deputados como causas da destituição. Foi também o instrumento usado pelos países vizinhos para suspender o Paraguai da Unasul e do Mercosul. Quatro meses depois, os deputados paraguaios a rechaçariam por ampla maioria, em clima de celebração.

Na TV, o embate final

Na noite da quinta-feira, 21 de junho, a Câmara dos Deputados apresentou a acusação formal que embasaria o impeachment. Lugo foi notificado às 18:10, dando à sua equipe de defesa 17 horas, noite adentro, para preparar a argumentação. Ao meio-dia da sexta-feira, diante dos 45 senadores, teria 2 horas para refutar as 5 acusações listadas no libelo acusatório.

Naquela noite, com o relógio em contagem regressiva, o deputado colorado Oscar Tuma, principal advogado de acusação, protagonizou um histórico embate com o advogado de defesa de Lugo, Antônio Ferreiro, ao vivo, pela televisão. Foi o mais extenso debate sobre o juízo político, acompanhado com avidez pelo público paraguaio. Foi ali que Ferreiro teve tempo de expor seu principal argumento: “Quando se tem 5 acusações, duas horas para a defesa é um fuzilamento”, repetia, irritado.

Em reposta, calmamente, o deputado Oscar Tuma explicava que “um juízo político geralmente se faz quando há mortes”. “Nós podemos aguentar muita coisa, viemos aguentando muitas coisas que estão nos ‘causais’ da acusação, que se deram anos atrás. Mas quando existem mortes…”. Para Tuma, não havia outro responsável pelos traumáticos eventos de Curuguaty: “Se você me perguntar quem é responsável por todas as mortes, eu vou responder: Fernando Lugo é responsável por tudo que estamos vivendo”.

Ferreiro, renomado jurista, chegou a dizer que pouco se importava que se julgasse o presidente. Sua irritação crescia ao longo do debate, enquanto gesticulava avidamente. “Vamos ter menos de meia hora para defender cada acusação. Para discutir a responsabilidade de um acidente de trânsito que não tenha sequer feridos temos mais tempo aqui no Paraguai. Para responder a um processo comum, de descumprimento de um contrato para construir uma muralha, tenho 18 dias”.

“Repito, porque isso é grave: estamos destroçando a vigência dos princípios jurídicos ocidentais no Paraguai. Isso nos vai custar caro”, disse, exasperado. “Esta crise vai levar 20 anos para se solucionar” – concluiu, exasperado.

Creative Commons - CC BY 3.0

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