​Um político para cada eleitor

 

Com a ajuda da big data (grande conjunto de dados armazenados), candidatos podem aferir desejos íntimos de cada pessoa, oferecer mensagens personalizadas e adotar os formatos que mais lhe atraem. Tudo isso em escala industrial.

O uso desse tipo de técnica chamou a atenção durante a campanha eleitoral norte-americana. No Brasil, a utilização da big data por políticos está só começando. Responsável pela campanha virtual de Donald Trump, a empresa Cambridge Analytica já está em atividade também no Brasil, onde firmou parceria com a CA Ponte. Entre os serviços oferecidos, estão, segundo o site da empresa, pesquisa de mercado, para descobrir “como a sua audiência pensa e se comporta”; integração de database para centralizar “seus diferentes bancos de dados para trazer muito mais valor a eles”; data analytics, que permite conhecer “profundamente a sua audiência”; segmentação da audiência, a fim de prever “segmentos da população com maior afinidade com a sua campanha” e comunicação segmentada, desenvolvendo “campanhas multi-canais para engajar segmentos prioritários”.

Assim como a CA Ponte, várias empresas disponibilizam serviços desse tipo. Até a eleição passada, o pagamento pelo impulsionamento de publicações para determinados públicos na rede não era permitido. A reforma eleitoral permite o impulsionamento, mas ainda há controvérsia. O texto aprovado pelo Congresso Nacional dispõe que é “vedada a veiculação de qualquer propaganda paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos”.

No dia 18 de dezembro, o TSE divulgou resoluções que detalham as regras eleitorais, inclusive sobre o ambiente virtual, e manteve limites à propaganda na internet. De acordo com o tribunal, as propagandas somente poderão aparecer nos sites de candidatos, partidos e coligações, sendo vedada em páginas que pertençam a pessoas físicas ou empresas privadas. Todas as resoluções podem ser modificadas até o dia 5 de março, prazo final para publicação das regras eleitorais. Antes, o contato com os eleitores ocorria essencialmente “de forma analógica”, a começar pelo diálogo direto com a população, o chamado corpo a corpo. Além disso, pesquisas feitas por diferentes institutos buscavam captar informações sobre os eleitores.

Na principal rede social existente no Brasil, essa estratégia pode ser viabilizada por meio do chamado dark post. Trata-se de uma publicação patrocinada segmentada para um grupo específico de pessoas e que não aparece na timeline da página que gerou esse conteúdo. Isto é, um candidato pode dizer que defende a legalização da maconha para pessoas que concordam com essa ideia e falar exatamente o contrário para aquelas que discordam, sem que essas opiniões sejam visíveis para quem procurar na página dele informações sobre propostas.

Além de afetar o eleitor individualmente, o direcionamento excessivo pode prejudicar o debate na sociedade. É o que aponta a integrante da organização Actantes, Patrícia Cornils. “Tomemos como exemplo o Jornal Nacional. Todos nós podemos assistir e, a partir disso, construir uma crítica ou uma concordância sobre os conteúdos. Já essa propaganda direcionada é absurdamente fragmentada. Só quem está fazendo e direcionando sabe quem a está recebendo. Como é que você cria um debate público sobre as políticas?”.

15 de Dezembro, 2017